Poentes e Nascentes

Aquele longínquo instante me deturpa,
é mais que um alucinógeno é saudade petrificada,
saudade mórbida; sofrimento latente; e qual não é?
Não é mais aquele poente, nem nascente,
nem a própria dormência é capaz de me calar.
Os morros distantes que eu não vejo me enchem de calafrios...
Eu te perco a cada hora que passa; eu permito que você se esqueça.
Não me deixe acreditar que você é um fraco, que nós dois somos fracos.
Eu te perco enquanto caminho em direção a depressão,
ao poço mais fundo, ao sentimento mais agudo de reprovação.
Reprovando a mim mesma.
Eu te perco nessas palavras;
palavras fortes que me pisoteiam no momento em que as encontro,
no ponto em que as dou a luz.
Mas eu só vejo escuridão emergindo de mim.
Eu só vejo medo traçando minhas palavras,
corroendo os meus sonhos, destroçando o meu intimo.
O meu intimo tão seu.
Eu me neguei revelar-te,
me neguei ao amor que eu tanto queria,
o beijo pelo qual eu morreria,
a pele doce e branca pela qual eu me deleitaria depois de guerrear
pelos séculos que nos aguardam.
Minha fragilidade, minha tola e amarga exaustão perante o mundo.
Em troca de uma alegria,
uma alegria livre de perversidade,
livre de nostalgia,
repleta de poentes e nascentes sob a luz dos olhos teus.
Entre os toques e beijos teus.
Sobre o meu corpo o ranger do amor antes encarcerado de tédio e
devoção no seu despertar.
Não é mais por mim e nem pelo tão sonhado “seu amor” que eu me declaro, mas por Deus que há de ouvir meus lamentos,
que há de me conceder alguns segundos de teu afeto adormecido por mim. Deus há de me recolher dessa imundície,
desses meus amigos que me fazem mais mal que os meus desafetos.
Deus há de sarar minhas feridas internas,
restaurar meu contentamento em viver, e me acolherá entre os seus.
Sinto não poder deslocar de mim essa angustia
que há muito sinto devastar meu peito,
nem cessar essa amargura infinita que se apossa de mim a cada ontem esquecido.
É uma grande pena ter como bagagem
uma existência confiante e esperançosa num falso amigo,
vai além da esperança, vai além de uma verdadeira fé,
meu acreditar já está cansado, mas se mantém em pé e dará as mãos a qualquer um que vier.
O que importa é que eu nunca vou tolerar a desesperança.
Estou cansada de me convalescer, de me restringir, de me agredir,
não é de minha vontade competir, eu evito, mas não tenho êxito.
Eu me vigio, mas não admito me crucificar
se me pegar com o olhar a ter miragens contigo.
É justo sonhar quem tanto pesadelo teve,
é direito acreditar quem nunca infringiu leis maiores.
A eternidade é para as pessoas que sabem ser mortais
e na complexa mortalidade de ser,
acredita-se que a nossa riqueza
está em viver alheio aos confrontos e entre
o nosso sonho mais intenso de amor.

14/12/04