Sedento, arquejante, em delírio, cruzo os desertos de uma vida!
Onde dessecar-me quando, as águas que encontro, deixam-me mais e mais faminto?!
Onde a Fata Morgana bastante para aquele que, em areais escaldantes, moveu montanhas, apenas para poder merecer delírios?! Onde?
Onde saciar esta fome imensa que, cada vez mais e mais, se agiganta – este vazio no estômago de quem, um dia, sonhou, da vida, sentir oníricos sabores? Onde?
Sedento, arquejante, em delírio, prossigo!
Risco folhas com a ponta das canetas, marco, passos nas areias, escaldantes.
Queimam! Ardem! – os olhos que tentam, sem avisos, olhar, o que pareço ter descrito! Vejam!
Olhem o bastante para verem a sede que tenho!
Vejam os meus delírios! Á! É porque eu a vejo – É a ilusão que chamei Margarida!
Um sonho que tive, sedento, arquejante, em delírio!
Um sonho distante, de há muito, um sonho de Dioniso, de quando, mesmo, sequer desertos havia! Vejam!
Falo por todas as vidas que, cansadas, em cada peregrino, ousam arriscar-se a desafiar os desertos dos destinos!
Mas, eu grito!  São miragens, tudo o que somos!
Somos sonhos!  Que ascendemos dos desertos onde queimamos!
Somos as terras que não as semeamos, os amores que não os sofremos, as dores que não as amamos, somos.
Somos as vidas que cruzamos, onde, cansados e sedentos, famintos e arquejantes, deliramos, nos sonhos e nas quimeras que são miragens que, por sermos ainda desertos, em nós mesmos, como as Fata Morgana, nós que, apenas, e para vagarmos ainda, os criamos!

MARCELO GOMES JORGE FERES
© Todos os direitos reservados