Provou do amor o sabor mais agridoce; surpreso com o que não pensou que fosse; preso ao esplendor do que sabia que seria. Provou da poesia o néctar vário (e como varia!); e chorou o pranto arbitrário do desencanto de quem queria por querer o que sabia não poder; mas sorveu também a fantasia em que o amor disfarça o rancor e encanta o viver. Perfume que fica e que passa, azedume que pica e vicia, espalhou sua poesia gota a gota, taça a taça, sobre a maré (que vai e vem, que era e é), e soube do verso a frente e o reverso e a face oculta (a frase que fala e a frase que escuta, a rima que cala e a rima que exulta).
Viu três lados da moeda; e ascensão; e queda; e superação. Pescou na atmosfera cardumes de prata; transpôs seus lumes em pressa, espera, barulho e paz; e seus mergulhos geraram sempre mais poesia e prosa, cravo e rosa, antes e depois, frente e trás. Sugou dos corações dilemas remotos, e tudo virou poemas mortos e reações fleumáticas, rimas semi-automáticas, pedaços de universo, marca-passo, sobreviverso*.
E quanto mais se sobrescrevia, tanto menos poeta se via, que nunca atingia sua meta de captar nas entrelinhas de tanta poesia que ia e vinha a secreta matéria (ilusão) de que sua etérea composição consistia...
Absolutopia.
* "Sobreviverso" não é meu. Acho que li de uma grande poetisa...
Já "absolutopia", que me recorde, nunca vi antes.
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