Mundo sombrio e breve de dores infindas,
onde cantar não posso os meus vindoiros planos,
deixa-me ser poeta em teus escuros vales...
ter no peito a luz que se oculta dos humanos!
Farto sei que estou de buscar a mesma nota,
falta-me nos lábios a tua melodia,
que fôlego me dê nesta procura intensa
de algum portento achar nos escombros do dia.
O sol é um soberano que escravos nos torna,
pérfido, de forma sanhuda vocifera!
Já a lua é uma mãe que sopra-nos o descanso,
trazendo no olhar o afago da primavera.
Oh! Deixa-me mundanas vibrações do tempo,
sinos vestutos que se alentam do meu medo,
sonhar no leito calmo dos montes silentes,
onde as broncas ondas não ferem o penedo.
Quero poder libar o lume destes astros
e afogar meus passos no prodígio dos cantos,
e respirar o amor tão puro e cintilante,
como no amanhecer estes doridos prantos.
Leva-me loucura aos teus palácios insólitos,
ao átrio confuso mui pouco visitado!
Jamais terei queixumes na vida sem rastros,
quando feliz herdar teu encanto ignorado.
Ou leva-me senhora que vaga p`los mares
numa barca fria como as lajes e o inverno,
a prometer melhores canções que as de agora,
vertendo sobre mim o teu amor materno!
Hei de tocar teu seio co`a gélida face,
beber em tua taça o sono mais profundo.
Que seja minha amante a pálida viúva,
a qual odeia a vida, como odeio o mundo!
E, sem demora espero repoisar contente
numa longínqua quadra, onde etéreo serei,
colher na áurea natura o meu alento raro,
sorrir decerto ao léu, pois faz assim um rei!
Alexandre Campanhola - 2005
© Todos os direitos reservados