À SOMBRA DO CIPRESTE

 

Quero a folgança que me acende a paz

das cordas ociosas de uma viola,

sentir no lodo como em um jardim

o suspiro perfumado da aurora.

 

Quando a vida florescer em meus olhos,

não me enganarei com o tíbio vinho.

E, se eu retumbar meu hino leviano,

trazei-me vosso prazer escarninho.

 

Devo respeito às sombras merencórias

que dormem em suas lajes tristonhas.

A morte é o regozijo inesperado,

mente quem a julga triste e medonha.

 

Quão tácito é sentir que estou sozinho,

penso até ser um cantador agreste.

Espreita-me a turba curiosa,

sorrir e cantar aos pés do cipreste.

 

Não venho do alcoice, mas tenho afã

de cerrar a fronte e honrá-los absorto;

a cada albor surge uma escravidão,

mas tudo acaba, quando se está morto.

 

Honro o cetro augusto em vossos leitos,

purga do mundo a vergonha incessante.

Embuçados de terra sóis mais limpos

que muitos nobres de traje elegante.

 

Invejo-vos! Pois a dor me acompanha

e nem os vermes serão tão vorazes.

Guardo o momento do cantar leviano,

e a mudez dos que não mais capazes.

 

Em nome do sossego em vós afável,

Deixai-me, pobres irmãos, repoisar

cansado de vogar em toscos mares

à sombra pálida de vosso altar.

 

ALEXANDRE CAMPANHOLA - 23/07/2002

 

Alexandre Campanhola
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