LITERALMENTE

 
  
Há dias assim;
Enterrei-me no sofá.
 
Literalmente.
 
Deixei descair os ombros,
escorreguei languidamente
o meu corpo
sobre o couro puído,
estiquei as pernas
e preparei-me para ler
um livro de poemas
 
Eram poemas banais.
 
Falavam de coisas menores,
como a tristeza, a alegria,
o amor
coisas do dia-a-dia
e outras coisas mais.
 
 
Eram lindos poemas
…mas de palavras banais
 
Não falavam da antipsiquiatria
do indígena da austrália
que o torna imune
a poemas menores
e por via disso não entra em stress
 
Nem falavam do nativo
da etnia mandinga
da Guiné-Bissau
que deixa a sua fortuna
não ao seu filho
mas ao filho da sua irmã
e por via disso
não tem dores de cabeça!
 
Kafka no seu processo
não explica
e Freud também não
porque se tem dores de cabeça
por coisas triviais
 
Então… entrei em stress
 
 
Languidamente
enterrei-me um pouco mais
fechei os olhos
encostei a cabeça
e fiquei a matutar
na merda dos poemas
que falam
de coisas banais
 
só então reparei
que o meu livro de poemas
continuava imóvel
adormecido na estante
 
Há dias assim!
 
Há por aí algum doutor
que me explique isto?
 
Há falte de um…
aceita-se um louco!
 
Literalmente