MÃE, MÃE, MÃE...

Eu era carona na marginal...
Na vizinha cidade pacata
Ocorreria um enterro a mais

Seu corpo jazia lacrado
Não, não era por vaidade...
Pois sua luz sempre acharia caminho
Pelos vãos dos parafusos
Daquele esquife indevassável

Imaginava os presentes ali parados, quietos
Interiormente irrequietos e difusos
Ruminando dialetos secretos,
Impagáveis na confusão incompleta
De seus indefesos intelectos...

E eu carona na marginal, retornava...
Não entendia mais o que seria um retorno
Ignorava completamente
Porque aquela imensa carreata andava
Por aquelas pistas sonoras, molhadas
Para onde afinal iriam,
O que de verdade quereriam
Daquela ignota vida escrava...

Mas eles iam e iam, falavam e sorriam
E, incrível, não achavam que iriam para a morte
Apenas entendiam que sim, chegariam...
População de muita, mas de muita sorte...

Eu era carona na marginal...
A cabeça vazia, de tão indigesta
No peito aquela dor muda, longa...
Nas laterais da visão
Cortava um negro
Em uma infinita linha reta
Tentando esconder-me
O que seria sua imensa falta
E eu tão quebradiço, disto,
Ainda a não saber...

Eu era carona na marginal...
Naquele regresso imbecil,
Naquele trânsito infernal
Pois até hoje não encontrei
Esse tal caminho de volta,
Nem uma satisfatória resposta
Sobre a vida, sobre a morte
Sobre esse estúpido e inútil vazio
A que seu sumiço me transporta...



Gê Muniz