“Que desespero na floresta se não houvesse o colibri!”
Victor Hugo
Existem na natureza alguns elementos destinados à utilidade. O homem desfruta esta utilidade naturalmente sem nem mesmo pensar nela, mas a verdade é que a súbita privação destes elementos causaria alguns transtornos, desconfortos, incômodos, neuroses mesmo. A vaca, por exemplo. A galinha. Aprendemos desde a mais tenra idade escolar que esses bichinhos nos fornecem o leite, a carne e os ovos tão necessários à manutenção do nosso organismo. O que seria de nós se nos víssemos repentinamente privados dos ovos fritos que nos salvam da inanição quando não há mulheres em casa para cozinhar? O que seria das mesmas se não fosse a carne? E o leitinho das crianças?
Todos nós ouvimos ou lemos também na mesma infância as historinhas da Cinderela, da princesa que beijou o sapo e do patinho feio. Joseph Aldrich diz que o que todas elas têm em comum é que descrevem uma peregrinação em direção à beleza e que ela é irresistível. A beleza é irresistível. Mas será que ela é útil? É necessária? Será que ela é fundamental como disse Vinícius?
Dario (ou Dadá Maravilha), célebre e carismático artilheiro que passou por estas terras (gaúchas) em tempos passados (certa vez homenageou cruelmente os torcedores bageenses com o gol “cabra macho” em um jogo contra o Guarani), comparava-se ao helicóptero e ao beija-flor, dizendo que somente eles tinham a capacidade de parar no ar. Não por acaso Dario teria feito essa comparação. O colibri é realmente de todos os pássaros o mais encantador, pela sua leveza que pára no ar. Não há quem resista a ficar contemplando quando um beija-flor se aproxima, lépido, faceiro, sugando néctar aqui e ali. No entanto ninguém tenta apanhá-lo. Nem mesmo tocá-lo. Apenas ficamos torcendo para que ele não se vá tão rapidamente e nos brinde um pouco mais com a sua beleza e encanto.
Uma ilustração possível e anônima: a do cesteiro que vendia dois tipos de cestos pelo mesmo preço. Um era simples, apenas de palha trançada. O outro era decorado com belas pinturas. Aos que perguntavam, surpresos, por que ambos custavam o mesmo preço, ele respondia:
- Eu vendo apenas o cesto. A beleza é grátis.
A beleza é de graça. Na verdade, a beleza faz-nos o favor de existir. Não pode ser tocada, e nisto reside o seu segredo. Beleza é como leite, é como carne, é como ovos. Essencial à manutenção do espírito.
Algumas mulheres são como os colibris. Voejam em torno de nós, sugam os néctares disponíveis, encantam por um poucochinho de tempo e vão embora, tendo cumprido sua função: serem belas. Que ninguém tente adjetivá-las pobremente. Um colibri não pode ser inteligente porque a tarefa de encantar toma todo o seu ser de uma forma tão completa que não sobra tempo para pensar. Um colibri não pode ser sedutor porque suas características são etéreas, quase de anjos, transcendendo os desejos humanos. Um colibri não pode ser palpável; ele é arisco, medroso, não deve ser aprisionado, caso contrário morre.
Ao encontrarmos um espécimen deste colibri não tentemos tocá-lo ou seduzi-lo. Nem esperemos que nos brinde com alguma idéia genial. Não é esta a sua função.
Mas... e quanto a sua utilidade?
“Que desespero na floresta se não houvesse o colibri!”
Que desespero em nossa selva se não existissem estes colibris.
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