Vivendo com Narciso

A quem convive com um narcisista.

Quando me amou, era um amor próprio,
Um reflexo teu no espelho.
Era tão maravilhosa, tão perfeita
Que embebi meu ser neste encantamento
E a partir daí deixei de ser quem eu sou.

Sob tua visão eu era nada quando mostrei meu tudo.
Culpa, caráter questionável, esforço pífio,
(Tudo isto era meu, os louros da glória, teus...)
Contribuições mínimas e sempre um menosprezo
Porque nunca houve amor sincero por mim, apenas por ti...

A maravilha que enxergava em si mesma:
Nada a mudar, tudo a conquistar;
Nenhum erro íntimo, sempre o dos outros;
E uma necessidade de demonstrar sucesso,
Exibicionismo de alegria e prosperidade
Os quais, entre quatro paredes, não ocorria...
Calor e humanidade aos de fora,
Frieza, distanciamento e secura por dentro.

E fui diminuindo, embora errado também.
Ao decepcionar tuas expectativas, virei um monstro,
Alguém asqueroso, inapto e não merecedor de nada,
Além de castigo e sofrimento.
Tão fundo as críticas me tocaram
Que seja por manipulação ou dor,
Acreditei...

Mas eu fiquei, pois havia amor e idolatria.
Nem sei mais o porquê...
Vi que tudo era sobre construir o material
E emoções e sentimentos eram supérfluos.
Nenhum diálogo para resolver problemas:
Para ti isso era inútil e desnecessário.
E zombava das minhas expectativas, de romantismos,
Posto que, amor real era construir e confiar cegamente
Em ti, quando tu não confiavas em ninguém...

Sempre traição e perfídia da parte dos outros;
Sempre honra e sinceridade da tua...
Mas o mundo e eu vimos que mentias,
Embora fosse para ti um ultraje.
O desamor e desinteresse no que não te cabia
Na ótica de teus óculos divinos
Não eram importantes, porque só valia o teu ego.

E foi me expulsando da tua vida
Com a premissa de que falhei em tudo,
De que absolutamente tudo era imperdoável,
Pois reagi às palavras e atitudes respondendo às frustrações...

E fiquei a ponderar se tudo foi tão grave.
As boas coisas sumiram: nunca fiz nada
Que ela não conseguisse sozinha...
Quando o espelho quebrou e não mais
Viste a ti mesma em mim,
Só restou influenciar o insuportável
Para que novamente ninguém apontasse os dedos
À princesa encantada que dorme em teu âmago...