FANTASMA
 
Fechei a porta, apaguei a luz, deitei na cama e puxei a coberta. Vencida pelo cansaço deixei os olhos se acostumarem com a escuridão do quarto; a negritude resistia e sombras densas caminhavam em minha direção. Custei a acreditar que as trevas pudessem se materializar em formas disformes... Pisquei os olhos, para testar se aquilo não era  fruto da imaginação;  mas as formas negras insistiam, avançando em direção aos meus olhos. 
Falei sério com Deus, disse-lhe, que eu não queria ver nada, não suportaria qualquer experiência do além. Sou uma mulher presbiteriana, calvinista, originária  da Reforma Religiosa Protestante e como protestante eu protestava aquela situação fantasmagórica! Fantasmas não existem! São contos de fadas... E nos contos tudo é possível, ogros, bruxas e gnomos  que fazem parte dos livros infantis e compõem a cultura  popular.
Decidi deixar os olhos fechados, para que as sombras não fossem ao encontro deles...  Então era isso! As trevas queriam a luz dos meus olhos.  Os olhos refletem luz.  Os seres humanos são como vaga-lumes que armazenam energia e as trevas são como insetos atraídos pela chama.
Consolada por essa teoria, que por força da circunstância, eu mesma havia inventado, afundei a cabeça no mar do  travesseiro e só acordei no dia seguinte com a claridade entrando pelas frestas da janela.
Pela manhã, comecei a refletir,  buscando fundamento para o acontecido. Lembrei-me,  que Jesus já havia sido confundido com um fantasma.
Isso mesmo, os discípulos estavam enfrentando uma terrível tempestade em alto mar, era noite,  o barco estava prestes a afundar. Foi nessa situação que apareceu um homem caminhando sobre o mar, num quadro assustador. Os apóstolos, confusos, gritaram:
_ FANTASMA! 
É assim que se denominam coisas que não se entendem. Como de fato, era uma cena de arrepiar os cabelos.
Jesus percebendo a confusão das mentes, por compaixão daqueles homens apavorados,  se identificou: 
 _ Sou eu, Jesus.
O apóstolo Pedro, o mais afoito do grupo, solicitou ao suposto fantasma que  calmamente andava pelo mar revolto:
 _ Mestre, se é mesmo o Senhor, manda que eu vá ao seu encontro.
Ao que Jesus disse:  _Vem.
Então, Pedro, foi o único homem, depois de Jesus, que andou sobre as águas. Está aí a vantagem em ser afoito... Experimentar coisas sobrenaturais!
Se Pedro, que andava “tête à tête” com Jesus, O confundiu com um fantasma, o mesmo poderia ter acontecido comigo.
Então, achei a solução que estava procurando. Quando a tempestade novamente invadir o meu quarto e a escuridão tentar confundir minha visão transformando  Jesus em fantasma, eu gritarei afoitamente:
_  Mestre,  é o Senhor?
_ Sim, sou eu.
 _ Então  permita,  que eu vá ao seu encontro.
 Selma Nardacci

Selma Nardacci dos Reis
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