UMA HISTÓRIA SIMPLES

UMA HISTÓRIA SIMPLES



É uma história simples... ou nem tanto:
Dois homens qualquer deles muito mal
Conheceram-se em dor, talvez em pranto,
Que sempre o há em quarto de hospital

Deixavam ao mais perto da janela
Sentar-se, mas só nestas condições:
Uma hora por dia!... E era nela
Que transmitia ao outro as emoções

Que esse, o mais distante, nem sentar-se!
Só tinha a posição de estar deitado
Apenas um alento... o deslumbrar-se
Com o que ouvia, do amigo ao lado

Ele lhe descrevia um grande lago
Com cisnes, lindas flores, e barquinhos
Casais de namorados, um afago,
Seus beijos, seus abraços, seus carinhos...

Dizia de uma banda que passava
Tocando talvez linda melodia
Ao longe enternecido ele a olhava
Mas como era distante, não se ouvia

Falava-lhe dum rio, do horizonte,
Das árvores, da linda paisagem,
Duma cidade grande sobre o monte
Embora já esbatida a sua imagem...

Transmitia-lhe a força, as esperanças
De um dia verem tudo a céu aberto
Falava-lhe dos risos das crianças
Brincando junto ao lago ali tão perto...

Ouvia... e sonhando imaginava
Como seria bom se houvesse a cura...
A esperança dia a dia acalentava
De um pouco de saúde... ó vida dura!

A enfermeira um dia, vindo ela,
(Manhã...prós banhos água lhes trazia),
Notou que o homem perto da janela
Morrera nesse sono em que dormia...

E mudaram o triste companheiro
Para essa cama que ficou de vago
Ali entrava o sol e bem primeiro!
Quem sabe... talvez visse mesmo o lago...

E é assim que um dia em menor dor
O homem, com apoio do cotovelo,
Tenta sentar-se e ver tudo em redor...
Do outro, a descrição, era um apelo!

Consegue a muito custo... mas que vê?
Uma parede apenas... de tijolo
E diz prá enfermeira " não pensei
Que o meu amigo fosse assim tão tolo!

Descrevia-me coisas... lindas... tantas,
Daquelas que a ouvir um homem sonha...
Não vejo nenhum lago, rio ou plantas
Mas só tosca parede, até medonha..."

"Senhor, o seu amigo" responde ela,
"Era cego, não via essa paisagem...
Contudo a sua ideia era tão bela:
Apenas queria dar-lhe uma coragem...

Que a força que se dá a um enfermo
Não cura grandes males, não senhor!
Não confere à doença o seu termo
Mas faz com que se sinta bem melhor!"


Joaquim Sustelo


(Adaptado de uma história que a minha filha me mandou, de que desconheço o autor)

Joaquim M. A. Sustelo
© Todos os direitos reservados