No tempo em que os animais falavam,
haviam avós.
 
Hoje também há avós,
mas não são iguais
aos do tempo em que os animais falavam:
são diferentes,
porque o tempo não é o mesmo:
é diferente.
 
O avô,
a avó,
eram uma espécie
sei lá
de coisa boa
de coisa muito boa
que se tinha sempre à mão:
um sorriso
um afago, um chocolate
um toma lá, esconde
e não digas à tua mãe que te dei isto.
 
Nós,
os pequeninos
achávamos que os avós
eram sempre eternos: nasceram velhos
sempre foram velhos
e não envelheciam
até que um dia a mãe dizia:
a avó morreu
e nós, os pequeninos
não sabíamos bem o que era morrer
e então víamos a casa cheia de gente
gente que não conhecíamos na casa da avó,
e nos passavam a mão pela cabeça e nos diziam
que menino tão bonito
num dizer tão diferente
do
menino mais bonito do mundo
como nos dizia a nossa avó.
 
A mãe para nos consolar
dizia que a avó tinha ido para o céu
e nós,
os pequeninos
que não sabíamos o que era o céu
mas sabíamos que era uma coisa boa
olhávamos para o céu e não percebíamos
porque a avó fora para uma coisa boa
quando a melhor coisa do mundo
estava aqui: Eu!
 
Até que um dia a mão dizia:
o avô partiu
e nesse dia ficávamos a um canto
feito de silêncio olhando o céu
sem perceber nada das coisas,
das coisas boas da vida.
 
A partir desse dia
deixávamos de ser meninos!
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 
 

santos silva
© Todos os direitos reservados