Não tenho janelas fechadas.
Minhas portas estão abertas.
Não sou uma enciclopédia,
Sou um livro de folhas soltas,
Algumas rasgadas, encardidas,
Outras riscadas pelo tempo,
Muitas úmidas , côncavas
E até convexas,  nítidas...
Nada há opaco ou apagado...
 
As letras é que estão gastas,
Pois muitos leem sem cerimônia
E me conhecem e me estudam
E me tecem variados comentários.
Há linguagem em todos os níveis,
Qualquer um pode me entender
Sem rasuras, sem ressalvas...
Mesmo os analfabetos me leem
E me compreendem a essência
Através dos traços sem palavras.
 
Os cegos também me conhecem,
Porque há um certo Braile em mim,
Logo não sou um desconhecido...
Sabe quem me conhece a fundo,
Porém não me compreende?
É a vida... Esta que deveria tudo
Saber de mim na ponta da língua,
Infelizmente não me interpreta,
Joga-me no glossário das dificuldades,
Num vocabulário sem sentidos
Que até Aurélio não tem como
Classificar-me... Sem resumo,
Sem qualquer comparação,
Exemplificação totalmente ausente...
 
Não sou extraterrestre, sou humano,
De carne e osso... Tenho sentimentos,
Sou lírico ou gótico a depender do
Momento... Choro, sorrio, zango-me,
Às vezes sou alegre, às vezes triste...
Não há preguiça em mim,
Sou dinâmico, trabalhador...
Não sou hipócrita, nem egoísta
E o orgulho sobrevive distante...
Por que a vida não me infere?
Será por que sou cristão?
Sou cristão ecumênico, pois
Entro em todas as casas de Deus
E sou bem recebido...
Tolero todas as religiosidades
Por uma questão de respeito,
Até de admiração. Não sou cético!
Como a vida me expele em seu íntimo,
É possível que a morte me entenda...
Será? Bem, eu sou que não a conheço,
Aliás, ninguém a conhece, é mistério...
Embora a vida me desfaleça perante si,
Confesso que a tenho na palma da mão...
Quiçá seja este o motivo... Eu a detenho!
E como a detenho, bom, aí está a razão:
Sou um intruso, perigoso detetive que
Está pronto para apontar-lhe defeitos,
Exigir justiça, pregar o amor, a fraternidade...
Então cheguei aonde desejava:
Sou perigoso delinquente através da arte!
 
 
 

 
De  Ivan de Oliveira Melo

Ivan de Oliveira Melo
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