Ah pátria,
já não te pertenço mais,
nem navio tenho, nem sei onde o cais,
deixa juntar-me aos meus que foram teus um dia,
cacos de sol dentro da poesia
que a ti componho como ode final,
sabes bem que nem foi por mal...
Me deito em papelões onde dormem multidões,
onde se aconchegam varados corações
como por flechas de São Sebastião;
nós, impuros de bolso,
soluços ouço,
a noite estende seu manto de estrelas rasgadas
sobre nós, que fomos tudo, somos nada,
só o amor é o nosso pão...
Ah minha pátria, que perdi ao me perder;
por um instante abres uma fenda por onde vaza
a claridão da alma que ilumina os becos do meu coração...
Me levanto e saio a dançar na rua vazia de tantos que partiram,
canto a rouquidão dos que gritaram em passeatas de salvação;
cansado, me deito e anjos varrem-me como cisco na imensidão...
© Todos os direitos reservados