Ouvi um pequeno sabiá cantando baixinho,
Naquele minguado quintal cheio de mato,
Embrenhado nas folhagens da mangueira;
Tanto eu tentei, mas não consegui vê-lo,
Com um tempo tão descompensado de calor,
Supus que chamasse a abençoada chuva.

Outros pássaros vinham às vezes aos bandos,
Fazendo algazarra com seu canto estridente
E ele parava como quem respeita os outros,
Para recomeçar sem trégua, logo a seguir:
Tão melodioso que a lindeza do instante
Inebriaria até o mais insensível dos audientes.

Debrucei-me na janela e estacado no parapeito,
Contemplava o ardiloso tempo inoportuno,
O sabiá que continuava sua serenata diurna,
No sol de rachar, mas com chuva se formando,
Cala-se de repente e não mais ouvi seu canto,
Mudou de palanque e foi cantar n'outro local.

E o astro-rei foi sumindo, sumindo no céu,
Por trás das nuvens espessas acinzentadas,
O dia então, de radioso tornou-se embruscado
Um vento forte estranho cruzou o portão,
Levantando poeira, folhas secas e gravetos
Não demorou para soar o primeiro trovão.

E eu fiquei pensando no pássaro cantor,
Como se abrigaria diante de uma tempestade;
Talvez goste de se molhar e ficar encharcado.
O toró então caiu com gosto e eu me surpreendi
Quando em meio à tormenta o sabiazinho cantou,
Completando com a chuva o meu contentamento.

MARCOS ASSIS

Marcos Assis
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