Sobre do mar o resplendor celeste

ao frescor da brisa adeja a gaivota,

roçando as nuvens no vermelho céu

que o anoitecer desbota.

 

Vai procurar entre o arrebol sombrio

o facho d`ouro, antes que a tarde caia;

antes que o véu dourado perca o brilho

e na areia se espraia.

 

O lençol, quando o sopro do crepúsculo

sua rútila imensidão esfria,

num instante se estremece dorido

em profunda agonia.

 

No areal a escuma corre silente,

alcatifada, a recender perfume,

como o incenso da maré noturna

flutuando no lume.

 

Um globo prateado se levanta,

vem plácido do horizonte no fundo,

refletir-se no espelho langoroso

do casto moribundo.

 

Enquanto, à noite, os astros golfeja

e a torrente escura logo se agita,

como é belo nas sombras dos abrolhos

o leito do eremita.

 

Que solidão junto aos altares santos,

onde um canto divino o amor ateia;

rente à margem do mar, em seu divã

canta a meiga sereia.

 

Canta à lua aquelas lembranças doces

do radiante oceano e do sol marinho,

que acendem no seio tantos arroubos

quando se está sozinho.

 

A imagem primeira, o saudoso beijo

lembra o avanço da onda na penedia,

este afago tão tenro que promete

a esperança do dia.

 

Entre a névoa da noite quanta glória,

envolve os olhos do cantor errante,

desmaiado no silêncio da praia

como um cálido amante!

 

Não há vozes, que paz! E tudo dorme

fulge o largo no mundo solitário.

Não há vozes? Só suspira a bonança

no tranquilo cenário.

 

Vasto templo que de passeios vagos

a memória do amor enche sentida;

num cismar remoto, na ventania

brota um pouco de vida.

 

Inspirado no poema Crepúsculo do mar, de Álvares de Azevedo

 

 

 

ALEXANDRE CAMPANHOLA - 06/08/2003

 

 

 

 

Alexandre Campanhola
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