LETRAS PARA UM ROMANCE (Tentando explicar a uma dama proibida a intensidade dos meus sentimentos)

Veio a palvra habitual
E tudo o que eu disse ficou sem valia.
Não te tocou a expressão verbal do meu amor
Diante das inconformidades de um modernismo exagerado.
Ser poeta é só isso?Um louco armado de verbetes
Retirados à força de um dicionário
Como um escudeiro invisível
De um Dom Quixote insano e triste?!

Veio a inspiração para um poema,
Noite após noite
Escrevi num caderno cheio de retóricas:
"Pelos teus cabelos obnubilados..."
E Sancho Pança rindo do velho Alonso
Que se lançara ao amor da jovem Dulcinéia del Toboso
(Nome extenso para tão curta ilusão),
Em cada verso invocado,
Era a extensão da loucura de um ao amor do outro.

Também o meu amor combateu gigantes no moinho
E viajou para as estrelas num corcel imaginário,
Tendo por fiel escudeiro este romantismo crônico.
Então eu,"cavaleiro da triste figura",
Por eternidades sofreei meu coração,
Te pedi abrigo,chovia inconsolável
E a noite me perdia.
Desci de minha vaidade depois de ter vencido
Num combate interior o cavaleiro dos espelhos,
E espiei pela fresta do meu elmo
Teus olhos vermelhos entre tramas de novelas
E horóscopo de jornal.

Era chegada a hora afinal,
Como um Dom Quixote às avessas
Li às pressas o meu poema:
"A paixão que vai e volta
É uma borboleta tonta
Sacudida pelo vento!"
Nunca um verso foi tão sincero,
Mas não te tocou esse argumento,
Olhou-me confusa,interrogativa,
Deixei Cervantes,fugi para a Ilíada
Onde espero explicar-te em Homero.

 

Gilberto de Carvalho
© Todos os direitos reservados