Fidelidade Trágica

            FIDELIDADE TRÁGICA
 
Numa triste despedida,
Ela, tão desfalecida,
Não parava de chorar!
Ele não tem mais demora:
Vai-se, em desditosa hora,
Para a fronteira, lutar…
 
- Nunca serás esquecida!
Não chores, minha querida!
Precisas muita coragem!
- Vais cumprir triste dever,
Indo a Pátria defender…
Deus te dê boa viagem!
 
Tirana separação!
Com enorme comoção
Vivemos esta partida!
E, se ele não regressar,
Ela diz que há-de ficar
Solteira, por toda a vida!
 
Ninguém o deve impedir;
Seu destino vai seguir…
Sabe Deus se voltará!
Se tal acontece, um dia,
Haverá mais alegria
Do que lágrimas, hoje, há!...
 
Quem adivinha o futuro?
Lá, num combate inseguro,
Ele pensa em sua amada.
Esta, definha, em tristeza,
Porque se sente indefesa;
Mais ainda: inconformada!
 
Tão triste, mas sempre linda;
E aquela dor, que não finda,
Aumenta a sua beleza.
Ternamente delicada,
Assim fora modelada
Pelas mãos da Natureza…
 
E continua formosa,
Tanto como desditosa,
A pensar nu noivo, ausente.
Resta-lhe a consolação
De que ele, no coração
A terá sempre presente…
 
Somente a correspondência
Encontra mais paciência
Para enfrentar a tortura!
Vão as cartas afrouxando,
E a pobre moça ficando
Mais triste que a noite escura…
 
Dois longos anos passaram;
As missivas terminaram…
Já ela desanimou!
Eis que chega àquela terra
Um fugitivo da guerra,
Que por ela perguntou.
 
Muito nervosa, a tremer,
Lá vai ela receber
Notícias do seu amado!
Ouve, com mágoa fingida,
Lamentar a triste vida,
Ao jovem recém-chegado:
 
- Pobre moço, que trazia
A sua fotografia
Sempre junto ao coração!
Ao meu lado combateu…
Mas um dia… recebeu
A descarga dum canhão!...
 
Sendo verdade ou mentira,
O malvado conseguira
O seu mais pérfido intento:
E assim se via vingado
Por ter sido desprezado,
Ao pedi-la em casamento.
 
Nem um gemido se ouviu.
Contudo a jovem partiu
Numa louca decisão!
Não pára o rio… e a corrente
Carrega um corpo, indif’rente..
São suas águas… caixão!...
 
E mais um mês se passou,
Até que alguém regressou
À sua terra natal.
Vinha coberto de glória,
Pois dera a maior vitória
À Bandeira nacional!
 
Muitos perigos correra;
Junto da morte estivera,
Sem virar a cara à luta!
Matar a sede de amor,
Eis o mais consolador
Prémio da sua conduta!
 
Foi então o mentiroso
Que lhe sorriu, desdenhoso:
- Lá se foi tua querida!
Jurei-lhe que estavas morto.
E a cachopa, por desporto,
Resolveu pôr fim à vida…
 
Cai, morto, no mesmo instante,
Aquele ser repugnante;
Vinga o moço a falsa jura!
E o jovem, triste, sombrio,
Desaparece, no rio,
Que a mais um dá sepultura…
 
            Concebido em 20-6-1967
Revisto em 14-12-1987

FRANCISCO MEDEIROS QUARTA
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