"Mas em quem podia se apoiar? Fez essa pergunta aos ventos selvagens do outono.

"Mas em quem podia se apoiar? Fez essa pergunta aos ventos selvagens do outono.

Mas em quem podia se apoiar? Fez essa pergunta aos ventos selvagens do outono. Pois era outubro e úmido como de costume. (...) “Em quem”, perguntou lançando os olhos às nuvens revoltas, entrelaçando os dedos enquanto se ajoelhava no peitoril da janela como a verdadeira imagem da suplicante feminilidade, em quem posso me apoiar?” Suas palavras formavam-se por si mesmas, suas mãos se entrelaçavam involuntariamente, como a pena escrevera por seu próprio arbítrio. Não era Orlando que falava, mas o espírito da época. Mas quem quer que fosse, ninguém respondia. As gralhas atropelavam-se desordenadamente por entre as nuvens violeta do outono. A chuva cessara, finalmente, e havia no céu uma iridescência que tentou-a a colocar o seu chapéu de plumas e os seus sapatos de cordões e dar uma volta antes do jantar."

“Todos têm seu par, menos eu”, refletiu enquanto atravessava desconsoladamente o pátio. Havia as gralhas; até Canute e Pippin — por mais transitórias que fossem suas alianças, esta tarde cada um parecia ter um companheiro. “Enquanto eu, que sou a dona de tudo isto”, pensava Orlando, mirando ao passar as inúmeras janelas brasonadas do vestíbulo, “sou solteira, sem parceiro, sozinha.”

"Tais pensamentos nunca lhe haviam antes ocupado a mente. Agora, esmagavam-na irremediavelmente. Em vez de abrir o portão, bateu com a mão enluvada para que o porteiro lhe abrisse. É preciso apoiar-se em alguém, pensou, nem que seja somente num porteiro; e quase desejou ficar para trás, ajudá-lo a grelhar sua costeleta num fogareiro de carvão em brasa, mas era muito tímida para pedir isso. Assim, aventurou-se sozinha pelo parque, vacilante a princípio, e apreensiva que caçadores furtivos, guarda-caças ou moços de recados estranhassem ver uma grande dama passeando sozinha."

                                                        Virginia Woolf - Orlando

Eloisa Alves
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