Se eu Fosse Objeto

    Se eu fosse um objeto não poderia descrever-me, jamais saberia si quer o que sou. Quanto objeto permaneço sendo-o e mais nada. Não haveriam pensamentos, sentimentos, inspirações ou desejos, somente uma existência à qual só cabe existir.

   Talvez isto soe meio preguiçoso para os mais ambiciosos, mas se fosse uma cadeira simplesmente seria e serviria para os propósitos de uma cadeira. Não intentaria ser um trono digno de um rei e nada mudaria para mim se de fato eu fosse. Desejar! Que infortúnio! Isto é para os humanos, não pra mim. Eles se lançam na vida e tentam constantemente ser mais do que são. E quando conseguem? Ah... Nunca! Vou lhe explicar melhor, eles morrem. Passam toda a vida inquietos e sempre buscando algo, se conseguem passam a desejar outra coisa. É uma existência marcada pela angústia de existir e só aplacada pela morte.
   Fato é que uma vez que fosse algo o seria para sempre, não mudaria o que sou como fazem as pessoas. Nem me intrometeria nos negócios do mundo, mas ele diria quem sou, melhor dizendo “o que” sou,  pra que sirvo e como devo ser usado. Ainda assim, isto não me faria afetaria ou faria diferença alguma, se ao menos eu soubesse de mim...
   Eu não teria sentido o frio incômodo de uma noite de inverno, nem o frescor das gotas de orvalho no verão. Não iria me lambuzar com o doce, nem engasgar com o amargo. Estaria livre de todas as experiências, boas ou ruins não importa, pois seria eu finito e acabado em mim mesmo.
  Sabe? Nada descreve melhor o humano do que duas palavras de uma canção, “metamorfose ambulante”. Na personalidade humana a única constante é a mudança. Eles mudam à partir das próprias necessidades, relações com o mundo e com o outro. Você mesmo leitor, agora já não é mais um mesmo que iniciou a leitura. Mas, se eu fosse um objeto jamais o teria escrito e tão pouco você teria a oportunidade mudar por lê-lo.

Walter Borges
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