O canário que cantava
 
No galho da goiabeira
 
O gato preto comeu;
 
Atirei o pau no gato
 
E o maldito correu.
 
Desatei a chorar
 
Enquanto isso a vizinha
 
Falou em me processar,
 
Que azar...
 
 
Eu quis voar aos céus
 
Me esparramei no chão,
 
Não apareceu
 
Nenhuma fada de condão.
 
E nenhum cavaleiro
 
Me estendeu sua mão...
 
 
Com a cabeça quebrada
 
Levei algumas palmadas
 
Além de uma dor medonha.
 
Resolvi ir à Espanha;
 
Voltei desapontada
 
E amarguei meu dissabor,
 
Porque nenhum jardineiro
 
Me ofereceu uma flor...
 
 
 Cansada,
 
Adormeci num banco de praça
 
Que desgraça!
 
Nenhum sapo-príncipe,
 
Nenhum beijo de amor,
 
Quanto horror!
 
 
Numa última jogada
 
Pensei em ser Rapunzel
 
De lindos olhos de mel,
 
De sorriso de criança
 
(Meu cabelo é minha herança).
 
 
Com o cabelo pichaim
 
Qual seria meu fim?
 
Serei eu o patinho feio?
 
Será o mundo mau assim?
 
Qual meu pecado, enfim?
 
 
O mundo é mesmo cruel,
 
Por que essa taça de fel?
 
 
Dessa forma eu me proponho
 
A esquecer todos os sonhos...

Nair Damasceno
© Todos os direitos reservados