OS PROVÉRBIOS
Era um casal simpático, ali no ônibus em que eu viajava e observava: ele, moreno, já trintão usava um terno comum aos seguranças, porteiros e vendedores. Parecia embevecido, olhando o rosto dela, que falava, falava...
Ela, de blusa e jeans parecia também encantada em falar para ele. Era bonita, sem pintura, seu rosto miúdo, cabelos negros e dentes e olhos expressivos. Já estava no ônibus , ele entrara e sentara ao seu lado, depois de um beijinho tímido, um "beijinho de passarinho".
- Quem me arranjou o emprego foi minha tia... ela já trabalha lá. Tinha uma porção de gente querendo, mas sabe né, ela pediu para o chefe, batalhou, batalhou e conseguiu..., ela falava com uma voz e um encanto que pareciam melodia.
E ele: -Claro," Mateus, primeiro os teus..."
E ela , num solo de violino: -Pensei até em esperar , aguardar coisa melhor...de repente, quem sabe?
Ele, uma tuba em descompasso: "-Mais vale um pássaro na mão que dois voando..."
- Sou igual a minha mãe, prefiro o ganhar menos e ter segurança do que esperar o duvidoso... ela harpejava.
“ - Quem sai aos seus não degenera..”. ele respondeu. Em um “allegro ma non troppo”, ela continuou:
- Vai dar até para guardar um troco, fazer uma poupança, juntar um dinheirinho, quem sabe?
“ - De grão em grão a galinha enche o papo...”; ele pontificou.
E ela, num” andante moderato”: - Amor, que comparação mais boba, francamente...
Num desafinamento total ele falou sério: “- Assim é se assim lhe parece...”
E ela como numa entrada de metais e percussão levantou-se e disse:
- Babaca, você já me encheu... e dirigiu-se para a saída do ônibus.
Ele espantado pela reação dela, aprumou-se e falou a meio tom:
“ - Antes só que mal acompanhado!”
Achei aquilo tudo tão despropositado, tão idiota que senti vontade de intervir, apaziguar. Porém pensei” - Quando um burro fala o outro murcha as orelhas”.
2012/10/16
Pedro Paulo da Gama Bentes
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