Balada do espelho

Eu era tão transparente
Que um dia me sumi
Me sentia tão contente
Em poder não existir
Os problemas que eu via
Agora não me viam mais
Era uma nova vida
Eu me deixava para trás
Quando eu me desapareci
Eu já não estava mais ali
Ainda não consegui descobrir
Por que eu me desapareci
E vagando pelas ruas
Já não consigo me ver
Estou vestida ou nua?
Só me falta enlouquecer
Pois um dia eu me sumi
Nem tinha pra onde ir
De repente me esqueci
Mutilado colibri
Não podia nem fugir -
quem mandou não existir?
Eu só queria saber
Por que eu me desapareci
A corda
A corda
Após um momento simplesmente acorda
E se corta
Já não é mais suficiente; a porta
- que importa? -
Se balançava impaciente
A hora
Era agora
Mais rubra que o sol poente
Um minuto de consciência
Um minuto de desistência
Um não que não se diz
Que faz de conta que o sim é feliz
Um minuto de existência
Uma breve luminescência
- ainda, que linda -
Ali sobre a penteadeira
Quando eu me desapareci
Eu já não estava mais ali
Mas sabia, e sorria
A dura inerte alegria
Fria, sentia
Agora não mais respiraria
Eu via que um dia
Todo aquele sangue voltaria