RASGANDO O PANO

Quando eu nasci, um anjo douto,
desses que publicam
teses emolduradas de literatura,
olhou para os céus, abriu os braços e disse :
– Pô, Deus, sacanagem!

E eu sai virado no mundo,
fazendo jus à parceria manca
entre minha mãe e algum pica-pai desfigurado.
Esculhambando meio-mundo
com meu spray de irritar paredões.
Com os braços destacadas do corpo,
dedos de versos demóticos
participando as paredes dos cabarés
e oferecendo bananas aos meus heróis.
Da poeira de Manga,
na bala perdida atingindo vidraça.

Sou guilh(erme)otina tranqüila e implacável
condenando a um mundo de lâminas
as imagens que desagradam
e jamais poupando as do meus gosto.
Trago-as para o meu terreiro
e fico me rufando a noite inteira,
ninando meus vizinhos zangados.

Sim, sou guilherme da marca silva
na mão carpinteira da poesia.
Cato a madeira-de-lei
e a trabalho até que ela chegue
àquele ponto em julgas imprudente
(incúria a tua rota reta de rei na barriga).
Pego a madeira- (tosca)-de-lei e a trabalho,
até que ela vire madeira-fora-de-lei.

Revisito os muros marcados
pelos versos retados de um severino
metido a basquiat.
E deixo no muro a marca-chocando da frase:
VIVA O POVO
QUE SAI DO OVO
PRA NÃO VOLTAR
Não cosa o pano.

Se não me abrem as cortinas, eu vou...

Montes Claros