Violão

Uma lembrança:
É a vida...
esta escrita enigmática de dois pilares pequenos,
que me entorna a face
e me fere os olhos insanos.

Mas tudo que vejo em minha frente,
é Eurídice a serpentear ao longo de um rio que passa
e eu paro e espero a valsa acabar.

Quando a noite chega sentada num carro branco,
com um véu semeado de estrelas,
é a deusa das trevas
que cobre de luto minha natureza.

Esfrego as mãos nos olhos da razão:
Não pode ser!
Não pode ser mão!
Não poderiam ser olhos não!

Mas aqui está este cavalo branco
a se fazer presente.
Estas asas compridas.
Este meu peito dormente.

Volte meu amigo,
Leve – me consigo àquela fonte.
Quero beber daquela água.
Contemplar o meu futuro.

E ele voa,
ao longo do todo.
Do Tudo.
Meu próprio ego foi se embora.
Meu ato ficou mudo.

É a filha do Caos
que permeia o vento.
Neste meu quarto escuro.
Este meu grito são.

É a vida.
Minha diva e meu divã.

Eu e meu violão.

Ricardo Abdala
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