Belém, três, nove, zero
janeiros, como te quero!
Começaste já bem forte:
a atalaia do Norte,
foi teu fortim do Presépio.
Teu fundador, um Castelo,
Feliz Lusitânia te ungiu;
homem de sobejante audácia,
arrostou mil forasteiros,
francos, anglos e batavos,
que estas bandas saqueavam
com afrontosa contumácia.
Belém da Cidade Velha,
que conserva majestosa
relíquia arquitetural:
fachadas de vetustos azulejos
belgas, da Gália ou dos ribatejos;
obra sacra que resplande
do gênio de Antônio Landi,
o bolonhês clementino,
que aqui, por felicedestino,
se fez parauara do Grão.
Belém, és bem a cabocla
bonita do extremo Norte,
fruto do amor proceloso
alienígeno-indígena
que povoou tua Hiléia;
és a feirante, a erveira das meizinhas,
que avia a "simpatia", cipós
e matos pro banho-de-cheiro,
de teu único Ver-o-Peso, feira
onde há "de um tudo", maneira.
Belém do Círio da Santa,
que deixa, na corda, bamba
a procissão dos devotos,
tão desconforme e tamanha,
senão que pela fé se suplanta;
da alegria da meninada,
cos brinquedos de miriti,
provindos de Abaetetuba
e de Igarapé-Miri,
pra ciriana jornada.
Belém de mangueiras esguias
que em verdes túneis se entrelaçam
para abrandar a quentura
que o sol do Equador irradia,
e frutos dar à fartura.
Agora tens um mangal
das garças, guarás, borboletas,
com um farol no vão central
que à noite alumbra silhuetas.
Belém, Cidade-Morena,
como te cantou Proença,
nos arroubos "maguenhéficos"
de suas crônicas domingueiras,
o tempo passou sem detença,
remoçaste!... e bem fagueira,
hoje és Cidade-Criança
Ès a roceira faceira
que dança em redor da fogueira
nos "arraiais" nas "quadrilhas",
nas noites de São João.
Ès também as matutinhas
dos grupos de pastorinhas
dos subúrbios, da Matinha;
do saudoso e boêmio Umarizal,
cujas valas viravam rios,
nas fúrias do temporal.
Belém bregueira sem dó,
do tecno, das farras do carimbó
do Pinduca, Verequete, Cupijó.
Mas tens cultura erudita,
da mais alta e fina expressão,
em recitais de música e canto,
comédia, opereta , cantochão,
como não se viu jamais,
que são a basto encenados
em teu Teatro da Paz.
Metrópole da Amazônia,
és portentosa, Belém,
na robustez do teu povo;
do ribeirinho que vai cedo
pra Feira do Açaí, "lá embaixo",
levar da silva seus frutos,
superando todo estorvo
da barrenta Guajará.
Pupunha, bacaba, cutite,
bacuri, muruci, piquiá,
umari, cupuaçu, biribá,
trazidos cos "sumanos",
em cofos e em paneiros,
são disputados irmãmente,
por "barão" e penitente
que vem da periferia
Belém, Senhora das Águas,
das águas das chuvas fartas,
rios, igarapés, igapós;
também da água que falta,
nas bicas das palafitas,
nos cortiços das baixadas,
que punge, confrange, conflita.
Belém do Marco da Légua,
do Bosque "Rodrigues Alves",
Do Museu "Emílio Goeldi",
da Casa das Onze Janelas,
das Docas, ora estação turística
das vistas do Ver-o-Rio;
da "emergente" Cidade Nova,
com a profusão de motéis;
dos casarões históricos em ruínas,
provocadas pelos "herdeiros",
ao retirar-lhes à burla o telhado
pra que a chuva os eliminem
e o terreno "valha ouro"...
pura especulação, " in limine".
Das pichações, sem paralelo,
neste mundo de meu Deus!
Da "bucólica" Mosqueiro,
do artesanato de Icoaraci,
do tacacá, da maniçoba, do açaí,
do pato no tucupi,
és sim, Belém - e dos teus!
Que mais benesses te faltam,
neste bosquejo-arrastão,
pra que teu povo pai-d'égua
te traga no coração?
Belém, és assim, urbe ubérrima,
por tudo isso e bem mais!
Não és cidade dos sonhos,
és um sonho de cidade!
Que merece todo o amor
de teus filhos parauaras,
que te querem sem vaidade,
senão com ufania e honor.
Homenagem do autor pelos 390 anos de Belém. 12/01/2006.
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