BELÉM, 390 JANEIROS

BELÉM, 390 JANEIROS

Belém, três, nove, zero

janeiros, como te quero!

Começaste já bem forte:

a atalaia do Norte,

foi teu fortim do Presépio.

Teu fundador, um Castelo,

Feliz Lusitânia te ungiu;

homem de sobejante audácia,

arrostou mil forasteiros,

francos, anglos e batavos,

que estas bandas saqueavam

com afrontosa contumácia.

 

Belém da Cidade Velha,

que conserva majestosa

relíquia arquitetural:

fachadas de vetustos azulejos

belgas, da Gália ou dos ribatejos;

obra sacra que resplande

do gênio de Antônio Landi,

o bolonhês clementino,

que aqui, por  felicedestino,

se fez parauara do Grão.

 

Belém, és bem a cabocla

bonita do extremo Norte,

fruto do amor proceloso

alienígeno-indígena

que povoou tua Hiléia;

és a feirante, a erveira das meizinhas,

que avia a "simpatia", cipós

e matos  pro banho-de-cheiro,

de teu único Ver-o-Peso, feira

onde há "de um tudo", maneira.

 

Belém do Círio da Santa,

que deixa, na corda, bamba

a procissão dos devotos,

tão desconforme e tamanha,

senão que pela fé se suplanta;

da alegria da meninada,

cos brinquedos de miriti,

provindos de Abaetetuba

e de Igarapé-Miri,

pra ciriana jornada.

 

Belém de mangueiras esguias

que em verdes túneis se entrelaçam

para abrandar a quentura

que o sol do Equador irradia,

e frutos dar à fartura.

Agora tens um mangal

das garças, guarás, borboletas,

com um farol no vão central

que à noite alumbra silhuetas.

 

Belém, Cidade-Morena,

como te cantou Proença,

nos arroubos "maguenhéficos"

de suas crônicas domingueiras,

o tempo passou sem detença,

remoçaste!... e bem fagueira,

hoje és  Cidade-Criança

 

Ès a roceira faceira

que dança em redor da fogueira

nos "arraiais" nas "quadrilhas",

nas noites de São João.

Ès também as matutinhas

dos grupos de pastorinhas

dos subúrbios, da Matinha;

do saudoso e boêmio Umarizal,

cujas valas viravam rios,

nas fúrias do temporal.

 

Belém bregueira sem dó,

do tecno, das farras do carimbó

do Pinduca, Verequete, Cupijó.

Mas tens cultura erudita,

da mais alta e fina expressão,

em recitais de música e canto,

comédia, opereta , cantochão,

como não se viu jamais,

que são a basto encenados

em teu Teatro da Paz.

 

Metrópole da Amazônia,

és portentosa, Belém,

na robustez do teu povo;

do ribeirinho que vai cedo

pra Feira do Açaí, "lá embaixo",

levar da silva seus frutos,

superando todo estorvo

da barrenta Guajará.

Pupunha, bacaba, cutite,

bacuri, muruci, piquiá,

umari, cupuaçu, biribá,

trazidos cos "sumanos",

em cofos e em paneiros,

são disputados irmãmente,

por "barão" e penitente

que vem da periferia

 

Belém, Senhora das Águas,

das águas das chuvas fartas,

rios, igarapés, igapós;

também da água que falta,

nas bicas das palafitas,

nos cortiços das baixadas,

que punge, confrange, conflita.

 

Belém do Marco da Légua,

do Bosque "Rodrigues Alves",

Do Museu "Emílio Goeldi",

da Casa das Onze Janelas,

das Docas, ora estação turística

das vistas do Ver-o-Rio;

da "emergente" Cidade Nova,

com a profusão de motéis;

dos casarões históricos em ruínas,

provocadas pelos "herdeiros",

ao retirar-lhes à burla o telhado

pra que a chuva os eliminem

e o terreno "valha ouro"...

pura especulação, " in limine".

 

Das pichações, sem paralelo,

neste mundo de meu Deus!

Da "bucólica" Mosqueiro,

do artesanato de Icoaraci,

do tacacá, da maniçoba, do açaí,

do pato no tucupi,

és sim, Belém - e dos teus!

Que mais benesses te faltam,

neste bosquejo-arrastão,

pra que teu povo pai-d'égua

te traga no coração?

 

Belém, és assim, urbe ubérrima,

por tudo isso e bem mais!

Não és cidade dos sonhos,

és um sonho de cidade!

Que merece todo o amor

de teus filhos parauaras,

que te querem sem vaidade,

senão com ufania e honor.

 

 

Homenagem do autor pelos 390 anos de Belém. 12/01/2006.
SÉRGIO MARTINS PANDOLFO
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