A Procissão

Segue solene a procissão,
matracando a calada da noite,
pelas ruas da cidade
professando a fé do cristão,
assoberbada de bondade,
ritmando cortejo e devoção
aos desagravos dos excomungados...
à luz de velas, lágrimas e rezas,
murmúrios e cantilenas,
guardados segredos da alma...
torvelinho de jornadas,
dores presentes e passadas.
Desfila submissão, ostentação,
ladainhas de consenso e contradição...
Imagens rememoram tradições
de antigas e romanas procissões.
Rostos sem faces, perfilados,
entoam afetos e desafetos,
deitam pelo chão os seus credos...
Louvam a bênção de cada dia,
o pão nosso que o diabo amassou
matando a fome de quem se fartou.
Destila mistérios que circundam
entre adeptos, crédulos e incrédulos,
tochas humanas que crepitam
desconjurando a prisão
no Jardim das Oliveiras...
Mãos postas, súplicas de perdão...
Ação tão traiçoeira!
Clérigos paramentados
destoam o profano, entoam o sagrado.
Povo que não mais renega,
culpa que ainda carrega...
E quem atira a primeira pedra?

E assim segue a procissão...
Brilhando qual constelação!

 
 
Carmen Lúcia & Angela Oiticica