Ser criança é estar dentro do ventre
Movimentar-se contente
E esperar pelo nascer
E tamém é estar dentro do ventre
Sofrer desde semente
Sem saber se vai viver.
Ser criança é enxergar o rosto materno
Tão amado e tão terno
Que por meses se esperou
E também é enxergar o sofrimento
Tão sabido desde o início
Pelo que não fez e pagou.
Ser criança é receber o amor e o mimo
A proteção e o carinho
Que a vida lhe permitiu
É também receber o ódio e o descaso
O abandono e o mau trato
Que desde sempre viu.
Ser criança é saber dizer mamãe,é saber dizer papai
Isto porque pôde ter
É também conhecer o que é a fome
E chorar porque ela rói
Sem sequer poder dizer.
Ser criança é deitar numa caminha
Tão quentinha, tão quentinha
Com um lar a proteger
É também se deitar num chão tão frio
Tão sozinho e tão vazio
Até prestes a morrer.
Ser criança é andar da mão de alguém
Sentindo-se confiante, podento acreditar
E também é ter mãozinhas calejadas
De tanto se pendurar nos ônibus
Sem saber quando e onde parar.
Ser criança é ter uma escolinha
Ter uma "tia" e coleguinhas
Para aprender e ensinar
É também ter a rua companheira
Desordeira, violentada
Lhe ensinando na maldade a lidar.
Ser crilança é voltar para a casinha
Sentar-se à mesinha
De barriguinha cheia agradecer
E também é andar mais um pouquinho
Até achar um lixinho
Onde encontre o que comer.
Ser criança é chupar um pirulito
É gargalhar com alegria pela vida e a fantasia
E também é cheirar uma colinha
E gargalhar com desespero pelo quero e não quero
E se saber aflito.
Ser criança é correr com liberdade
É sentir o ar batendo, trazendo felicidade
E também é correr dos malfeitores
Que perseguem os "menores"
Para lhes bater com maldade.
Ser criança é brincar com tanta coisa
Se divertir à prosa
Esperando o soninho vir
E também é brincar com tantas mágoas
Se divertir com tantas dores
Na esperança de dormir.
Ser criança é ir ao encontro dos braços de Deus
Ir feliz num sono profundo
E também é agonizar nos braços do estuprador
Ir ao encontro de Deus ainda com amor
Levando as dores do mundo.
Ser criança é ter direitos num papel
Lavrado e assinado por um poderoso
E também é conviver fora da lei
Sem direitos nem papéis
Neste mundo penoso.

Com amor às crianças que tanto
são! (Emy:1993)

Retrata um contexto histórico onde em nome do poder, muitas crianças e adolescentes pagaram com suas próprias vidas o que nunca deveram. Este poema foi publicado pelo MEC, no Plano Nacional de Educação para o ano letivo de 1993.

Goiânia, 1993