Uriel e Esdras
 
Uriel:
-“Traga para mim uma lâmina de fogo,
Uma medida de vento, logo,
E um dia do passado!”
 
Esdras:
-“Quem já nessa Terra que tem nascido e andado
Que pode fazer tais coisas inimagináveis?”
 
Uriel:
-“Quantos peixes há nos mares navegáveis?
Quantos os astros que há no céu?
Quantas as portas de saída do Inferno
E quais as de entrada nos céus?”
 
Esdras:
-“Eu nunca desci aos infernos,
Nem fui chamado ao Paraíso!”
 
Uriel:
-“E as árvores das florestas tramavam
Para invadir os mares e possuir a tudo,
E era assim tal juízo,
E as ondas dos mares subir as montanhas sonhavam...
Mas veio o fogo e consumiu tais árvores
E estas não tiveram escudos,
E as areias das praias bloquearam as ondas!”
 
Esdras:
-“Tolas estas árvores, pois delas são as florestas
E hediondas estas ondas, pois só podem viver nas águas!”
 
Uriel:
-“Veja que uma mulher que perdeu seu único filho
E sofria infindável mágoa
E no lugar onde ele padeceu surgiu uma cidade entre junquilhos!
Olha, lá voando, vindo dos mares, brilhante como brasas,
Uma águia com três cabeças e vinte asas!
E veja um homem pirofágico
Cuspindo fogo numa multidão!”
 
Esdras:
-“Mostra-me a interpretação e o significado mágico
destas visões aterradoras!
Se te apraz minha oração,
Conforta minh’alma sofredora...”
 
Uriel:
-“Escuta! Pois eu em tudo lhe instruirei
O que não podes compreender!
De modo claro lhe direi!”
 
E o Arcanjo desembaraçou as metáforas
E as metonímias, as hipérboles, as sinestesias
E um cem número de alegorias!