Aspectos da cidade

 Vão os carros de gado,
vão os trens de operários!
Qual é o salário
de vender a vida?
A cidade acorda nervosa.
Brigas e gritos.
Tem polícia nas ruas.
E malandros também.
Vejo no trem
as esperançosas pessoas
se renderem aos alaridos.
Um homem cansado cochila de pé.
Há risos no seu malabarismo.
Na cidade neurótica
consomem a vida,
em querer viver.
Que óptica é essa
que não consigo ver?
Um monstro enorme
que se alimenta, vorazmente,
de si mesmo.
Por ganhar o mundo,
ganhar a vida, doidamente,
a cidade, a esmo,
perde a vida,
feito bicho,
feito lixo,
porque a vida
já é ida!
 
(1982)