A extinção da natureza

 

Quanto mais a terra gira
mais perece a natureza
que mesmo sendo imensa
em variedade e vasteza
a humanidade consegue
destruir sua beleza
 
Nesse mundo corrompido
onde nós estamos vendo
os encantos da natura
sempre desaparecendo
vai surgindo um cenário
cada dia mais horrendo
 
Se o planeta é repleto
de riquezas sazonais
todas elas são cercadas
por rejeitos abissais
e o lugar sem impureza
quase não existe mais
 
Quero sempre expressar
o esplendor da natureza
mas a tal modernidade
corrompeu sua pureza
impedindo que ela seja
testemunho de beleza
 
Vendo rios e florestas
se acabando em agonia
inquieto e pasmado
me pergunto todo dia
o que faço do meu estro
num lugar sem poesia?
 
Como vou me inspirar
na sujeira de um rio
que a sua correnteza
joga sobre o baixio
misturada com o óleo
que vazou de um navio?
 
Como vou ser um poeta
se eu sei que a imagem
da espuma do riacho
avistada de passagem
é bonita num poema
e não é na paisagem?
 
Como posso descrever
os primores da natura
se eu só vejo na cidade
uma prosa obscura
que o lixo é o borrão
e o grafite é a rasura?
 
Só me sinto cerceado
preso em uma vertigem
vendo tanto ingazeiro
recoberto de fuligem
escondendo aquele viço
que existia na origem
 
Toda vez que eu estou
procurando por um tema
com o fim de traduzir
em linguagem de poema
posso até falar em flor
sem resolver o dilema
 
Se me ponho a versejar
com a verve do momento
avistando a minha rima
no azul do firmamento
lembro cada poluente
carregado pelo vento
 
E só sei falar em gás
que no ar fica disperso
em veneno entranhado
em rejeito submerso
como alerta sem efeito
rascunhado no meu verso
 
O planeta está passando
por mudanças radicais
pois o homem promoveu
desastres ambientais
e o progresso revelou
efeitos colaterais
 
Nos lugares que o homem
ocupou o território
transformou o ambiente
num grande laboratório
mas o estrago que fez
já é bastante notório
 
Os poluentes trazendo
seqüelas definitivas
que ainda não sentimos
por serem cumulativas
um dia vão produzir
auroras radioativas
 
Se a poluição fizer
uma mutação nas flores
em breve nós vamos ver
girassóis madrugadores
margaridas desbotadas
e orquídeas incolores
 
Nos jardins irão nascer
azaléias bolorentas
samambaias desfolhadas
violetas fedorentas
açucenas inflamáveis
e trepadeiras gosmentas
 
Com a degeneração
nós veremos espantados
em nossa horta e pomar
jerimuns atrofiados
laranjeiras venenosas
sabiás desafinados
 
Sem demora vamos ver
chegar o dia sombrio
com peixes e jacarés
se afogando no rio
poraquês descarregados
e piranhas com fastio
 
Se aumentarem os rejeitos
com seus efeitos danosos
nas florestas vamos ver
papagaios silenciosos
sucuris envenenadas
leopardos vagarosos
 
Os ambientes marinhos
poderão ser ocupados
por golfinhos sonolentos
camarões contaminados
as sardinhas solitárias
e pingüins esturricados
 
Nesses dias vão nascer
tartarugas estressadas
camelos desidratados
avestruzes engasgadas
albatrozes com tontura
capivaras desdentadas
 
Poderemos encontrar
seriemas coxeando
os macacos empalhados
as abelhas sem comando
os ouriços indefesos
as corujas hibernando
 
Desse jeito vamos ver
tatupebas soterrados
viuvinhas solteironas
gaturamos exilados
andorinhas carniceiras
e jabutingas inchados
 
Se continuar assim
ainda se vê um dia
onças vegetarianas
tubarões tendo fobia
os pavões desemplumados
carcarás só com azia
 
A natureza estertora
com tanta poluição
Se o mundo continuar
causando a degradação
só vamos ter biosfera
nas áreas de proteção

Carlos Alê
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