A sombra é companheira. A companhia da sua obra. Mas sempre a sombra sabe.
A minha sombra. Vem, vai, retrai. Brinca com o sol. Brinca com o lago em gelo
Brinca com o espelho.
É companheira de quase todas as horas. Só pousa quando dorme.

Sombrear é limitar, é controlar, é delimitar.
É contorno que não é genuíno. Mas tem genuinidade onde ?
A sombra não se esconde. A sombra não vem.
Olhos nos seus olhos, como se tivesse. Está lá para me reconfortar que estou aqui.

Se transparece se desvanece. A sombra interfere, sem ferir.
Ao nascer a morte é certeza. Outra certeza ?
Encontrarmos nossa sombra. Ao longo do viver.
Se estou ferido a sombra é o cão amigo. A sombra não pede, não reclama.

As sombras se somam. Mas não se misturam.
As sombras se acumulam, mas se desligam.
Levo e trago minha sombra ? A sombra é quem me leva ?
Se tão presente, tão fiel, por que nunca cantada ? Nunca falada, nunca amada ?

No palco de muitas luzes. O astro se projeta em muitas sombras.
Nesse momento se perde ou se multiplica ? Perde, porque no palco representa.
E se representa não é. A platéia não vê a sombra, só o astro.
Se me escondo a sombra denuncia. A sombra é um contraponto.

A sombra celeste, a sombra do astro rei. A sombra da lua. A lua na sombra das folhas.
A sombra protege os pequenos que não vemos. De tão pequenos que não tem sombra.
Se todo ser tem sombra. Então a sombra não é um ser. Porque a sombra não tem sombra.
Não ter sombra é não ter referência. No fundo do oceano a sombra não foi.

Tudo isso é solidão ? Não é multidão.
E se as sombras se falassem ? E se as sombras se comunicassem ?
Que linguagem tem as sombras ? A linguagem dos gestos ? Dos movimentos ?
E se as sombras se revoltassem, se isolassem ? E se se enfrentassem ? Se eliminassem ?

A luz está no centro da Física. E porque a sombra não está ?
Para Einstein a luz é tudo. A sombra é a certeza de que há luz.
A sobra do gigante fica pequena. A sobra do pequeno se agiganta.
Então, saia da sombra ou saia com a sombra.

Sérgio de Carvalho
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