"(...) pensando novamente quão obscura era a mente."

"(...) pensando novamente quão obscura era a mente."

De tudo o que existe, nada é tão estranho como as relações humanas, pensou ela, com suas mudanças, sua extraordinária irracionalidade, pois o desagrado que ela havia sentido já era agora quase amor intenso e arrebatado, mas, tão logo essa palavra “amor” lhe ocorreu, ela a rejeitou, pensando novamente quão obscura era a mente, com suas pouquíssimas palavras para todas essas percepções surpreendentes, essas alternâncias de prazer e dor. Pois que nome se dava àquilo? Era o que ela sentia agora, o retraimento da afeição humana, o desaparecimento de Serle e a necessidade instantânea sob a qual se achavam ambos de encobrir o que era tão desolador, tão degradante para a natureza humana, que todos tentavam enterrá-lo em recato para eximir-se à visão – esse retraimento, essa violação de confiança e, procurando uma fórmula decorosa, reconhecida e aceita, de funeral, ela disse:

“ Por mais que façam, não conseguirão, é claro, estragar Canterbury”.

Ele sorriu;  aceitou a  frase, cruzou as pernas ao contrário. Ela fez seu papel; ele, o dele. E assim as coisas terminaram. Veio logo sobre ambos essa paralisante cessação de sentimentos, quando nada irrompe da mente, quando suas paredes parecem de ardósia; quando o vazio quase dói, e os olhos petrificados e fixos veem o mesmo ponto.”

                                    Virginia Woolf - Juntos e à parte

Eloisa Alves
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