Vivo integrado ao mundo,
Me alimento de meu sentir gregário.
Mas na solidão de mim existe muito,
E não sei o quanto é este ‘muito’.
Apenas percebo que parece vezes transbordar,
Eis talvez a razão destas letras errantes.
Nesta minha inquietude interna
Acobertada por minha expressão de autocontrole.
Amo tempestades, raios e trovões,
Esta loucura antes me atrai do que amedronta,
Mas tenho a razão para saber
Que o natural seria humanamente temer,
Mas tem algo de caos que rege minha alma,
Que contraditoriamente
Se encanta com a ordem e a harmonia.
De minha finitude contemplo a suposta eternidade.
E esta sim me parece causar certo incômodo,
Pois eis que em sendo serei por muito tempo.
E há em mim uma consciência que parece senil,
Que se choca com uma faceta infante
Que continua a querer descobrir.
Falo do tempo, falo com o tempo,
Ah, velho Cronos,
Eis o mito a denunciar uma verdade,
Ou seria a verdade apenas o próprio mito?
Vejo o caminhar da tecnologia,
E gosto e desgosto,
Eis que a comodidade é contemplada,
Mas que a humanidade de ser é perdida.
Vejo no rosto dos meus companheiros de jornada
As mutações biológicas que traz o inverno da vida,
Neles encontro consolo
Para encarar minha imagem no espelho.
Hoje tenho capacidade de focar o cotidiano,
Mas sou o meu próprio personagem,
Meu sujeito está além disto,
E nisto não vai desejo de ver vantagem,
Apenas constatação que busca se autodefinir,
Incluir o significado no apertado espaço de um conceito,
Ah, já percebo que todo significado é limitado,
O todo de mim navega em inomináveis sentires,
E o sentir que antecipa a razão é graça infante,
E talvez em existindo uma alma
A minha tenha envelhecido,
Ainda que mantenha viva o infante que foi,
E que ainda insiste em viver,
Assim se encantando com o Todo,
Enquanto sua faceta senil,
Tal como um velho leão,
Busca abrigo para receber seu próprio fim.
Mas eis que o fim parece não ser o final,
Eis que pó e fogo parecem se conjugar continuamente,
E eis minha paixão, meu mito predileto,
A ardente fênix que alada
Voa pela janela entre vida e morte.
Não sei tudo de mim,
Quanto menos ainda dos outros.
E como que de soslaio vejo um alto pico sem base
Só existe nuvens e seu cume,
E ali me faço presente, vejo tudo,
Meu sentir parece entender,
Mas minha razão não compreende.
Eis que divago não por erudição,
Mas por ser necessário este movimento,
Que ora prezo tanto, para depois,
Almejar uma profunda paz niilista
Que parece surgir como oásis,
Desmentida por espécie de promessa oculta,
Um pacto que parece ser o meu propósito
Mas que conscientemente desconheço,
Mas que constato estar em mim.
Então me guardo em mim,
Me ponho a ouvir canções,
Desconheço as métricas,
Mas eu consigo sentir a notas
E elas tem sons e cores.
E eu assim vivo lúcido
Em meio a minha loucura de ser.
22/04/2023
Gilberto Brandão Marcon
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