Desci por uma escada de um céu onde anjos e ninfas

e seus primos e suas primas

brincavam multiplicando sonhos como fazem as abelhas com seu mel

e de longe ouvíamos pequenos demônios reclamando do gosto do fel...

 

Pé ante pé desci pela carne até ser a carne de meus próprios propósitos

e pela porta de minha mãe saí atravessando o silêncio de seu ventre

como escapasse de um deserto ou uma espécie de depósito

onde poderia nascer um outro de repente...

 

À primeira vista pensei ter chegado à Babel

vi homens escrevendo seus interiores em papel

que pensei antes de ter pensado que servisse

apenas à escrituração de poesia cozida em mel...

 

Sabendo se saber soube o que era destino imediatamente

por ter me convertido em ser humano e andante e espetáculo

por saber-me cheio de dúvidas e uma espécie de descrente

em tantas religiões e filosofias que nos usam como receptáculos... 

 

Posto que não se volta por ter rejeitado o céu de um deus isolado

e por ter lhe furtado a despensa roubando suas adocicadas maçãs

vi-me em barro envolto e com escamas e guelras e muito agitado

abri os olhos e o que pensei ser noite era uma esplendorosa manhã...

 

Assim fosse para sempre e eu teria feito uma prece e teria amado

mas nada é o que parece ser diante de nossos

olhos cheios de coloração

e um vulto pôs-se ao meu lado e perguntei-lhei o nome

e me disse: pecado

e então pude sentir que havia estado a enganar

minh'alma e meu coração...

 

Prieto Moreno
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