MESTRE DAS ÁGUAS
Você me ensinou
a não temer as águas
Ensinou-me a mergulhar no mar
nos rios e lagos
Mostrou-me como aproveitar
as ondas para velejar
Mostrou-me como se deitar
sobre as calmarias
Incentivou-me a saltar
de cascatas, cachoeiras
e fios d'água
Incentivou-me a ser veloz
nas corredeiras
Fez-me conhecer o leito
a superfície e o meio
Fez-me esconder nas locas
tocas, conchas e cascos
Levou-me a tomar banho de chuva
miúda, garoa, graúda
Levou-me até nas nuvens
para massagear-me com gotículas
Alegrou-me com doce sereno
Brincou comigo em meio ao nevoeiro
A serração era nossa casinha
onde abríamos portas e janelas
para o sol entrar inteiro
Encheu-me de sabedoria
Mostrou-me os perigos das curvas
das pedras escondidas
das barrancas escorregadias
e das inundações das ruas
Descortinou minha mente
diante das termas e das águas frias
dos gelos polares e das altas montanhas
Criou em mim o desejo
de ir ao céu com a evaporação
num sonho molhado de ilusão
Nas lagoas de águas claras
ou em meio a recifes de corais
fez-me desistir do medo
apenas, disse-me:
"tenha respeito,
as águas, também, têm o direito
de serem o elemento
que inunda, enche, afoga e lava
mas que leva e sustenta a vida
sem cobrar nada"
Cléo Anselmo