I

 

Vim, quem o sabe, d'outra era.

(Em meu espírito, eu não me lembro.).

Alma por alma, membro por membro,

Serei eu um homem ou uma fera?

 

Numa vida de teor feérico

Fui bom, celibático, justo...

Isso, foi, porém, num tempo vetusto

Onde meu pensamento não era histérico.

 

Minha carne é a mesma,

Mas, minh'alma, esguia com'uma lesma,

Escondeu-se em algum musgo, mudou...

 

Quando me devoraram os vermes,

Minha memória, diferente da dos paquidermes,

Evanesceu, morreu, também se dissipou...

 

II

 

Ó Brancas antífonas dos sonhos!

Medos, fúrias, amores, melancolias...

O crepúsculo me traz desconhecidas nostalgias

E sentimentos tão tristonhos...

 

Tenho uma enorme, imensa saudade

De outra vida, outra dimensão.

Não sei de quê... Ó reencarnação,

Revela-me, enfim, toda a verdade!

 

Mas eis que relembro d'algo que está além da morte:

Algo vago, ainda que forte,

Impalpável, atemorizante, rouco...

 

E lembrando do que fui, calado,

Enlouqueci ao recordar-me do outro lado;

Pois aquele que morre e lembra da morte também ficaria louco!...