Te encontrei, alma, enfim,
bem perto de mim, te encontrei.
Era eu mesmo, em outra idade,
do outro lado da janela em que sonhava
meus sonhos mais profundos e sagrados.
Refúgio das minhas tempestades,
Contemplando as árvores, os passarinhos,
Laranjeiras, macieiras, pereiras, figueiras,
os ciclos da natureza, e a harmonia universal.
Era uma criança, como qualquer outra.
Uma criança humilde e pobre,
quase esfarrapada.
Magra e esquelética, pedinte.
Era essa minha alma, com cabelos negros,
lisos e com o olhar suave.
Do lado de fora da janela, estavas tu,
olhando a mim mesmo, noutra estrada, noutra idade.
Quem olhava quem? Quem morria de saudade?
Fora de minha casa, mas bem pertinho, na janela,
alma querida existia, como verdade.
Eu enfureço, e, com a basculante, faço você rolar para o chão,
expulsando-te: não quero te ver, alma pensante!
Teu olhar é demais para mim, pergunta demais, e eu não suporto.
Quem é você para questionar os fundamentos da existência e vir assim,
cobrando posturas e arrependimentos?
Alma querida, em fim, te reconheci:
Você existe.