A Minha Luta Quotidiana

            A MINHA LUTA QUOTIDIANA
 
Já não tolero mais o dia a dia!
Saturado de tudo, que farei?...
Começa a vacilar a teimosia
Que me tem animado; fracassei…
 
Num ambiente hostil, que me rodeia,
Na minha terra, sinto-me exilado.
Culpar os outros? Não! Que triste ideia!
Sou de certo exigente e revoltado!
 
Nascendo numa aldeia pequenina,
Duma família pobre, quanto honesta;
Bem pouco mais que me defina:
Quase chego a pensar que nada presta…
 
Julgo que o tubarão, em alto mar,
Deve viver tão bem, como a sardinha.
Que ingénuo e descabido o meu pensar!
Só manda a lei da força; nunca a minha!...
 
Ninguém pode fugir à influência
Do convívio, no seu quotidiano.
Cada vez tenho menos paciência.
Não posso mais com tanto desengano…
 
Baixei os braços; não! Lutar, sozinho,
Nâo adianta nada; só dum louco!
Quanto já tropecei, no meu caminho!
De tanto protestar, sinto-me rouco…
 
Tenho batido em vão a tantas portas…
Todos dormem; ninguém me vem abrir!
Minhas esp’ranças vãs, já quase mortas,
Mandaram que deixasse de sorrir…
 
Fiz-lhe a vontade, pois venceu o tédio:
Vaguei de frustração em frustração.
Canto a minha derrota; que remédio,
Pois lágrimas… de nada servirão!
 
Para me tornar válido, embarquei:
Lá fora, abri os olhos, que não tenho.
Passados anos, para aqui voltei.
Começo vida nova, com que empenho!
 
Passei a contactar a sociedade:
Nela vi honradez e hipocrisia.
Como agradar ais homens? Na verdade,
Por muito que o tentasse, não sabia…
 
Quantas vezes calei a consciência,
Se esta barafustava, contra mim!
Achei exagerada a penitencia:
Certamente não levo a cruz ao fim!
 
Quis levantar a voz; mas, para quê?
Se est6ou cada vez mais desapontado?
Só o papel amigo é que em mim crê,
Se vou contar-lhe as mágoas, desolado!
 
Pois vai, bom camarada; e grita ao mundo,
Que o pobre também tem direito à vida!
Como os demais, é gente; e, bem no fundo,
Quanta nobreza tem, mesmo oprimida!
 
Com máscaras hipócritas que usais,
Amálgamas de risos e peçonha,
Os ingénuos incautos enganais,
Tão bem, que nem sequer sentis vergonha!
 
Sem mendigar favores a ninguém,
Que aos que governam, já o fiz, em vão,
Se nem me responderam, vê-se bem:
Têm mesmo cultura, educação!
 
Nesta terra, que estímulo teremos?
O de aprender melhor a rastejar!
Ficará na gaveta o que escrevemos,
Já que nada podemos publicar!
 
Desabafos de mágoa, e não vaidade,
Nos arrancaram esta confissão!
Matem-nos! Viverá nossa verdade:
Justiça carecemos; não perdão!
 
            24-6-1984

FRANCISCO MEDEIROS QUARTA
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