João do barro de Deus


De pés descalços sobre pregos afiar o martelo
Com calos no pensamento construo a oração
A obra não deve parar, pro bem de cessar o cego
O templo é Deus, meu pai; também de meu irmão
A caminhada é a vida toda. Depois, continua
Tijolo por tijolo, o muro na rocha vou erguê-lo
Pra deixar lá fora o mal que barganha meu coração
E aqui dentro proteger minha riqueza nua
 
O arquiteto me orienta nas medidas exatas
Ele é sábio e sabe do meu quase não saber
Ele é bom e bem sabe do meu terrestre viver
Ele é justo e junta as ações com minhas palavras
Sou apenas um pedreiro, matuto feito o valente João
Que pega no barro a inspiração de seus castelos
Eu, como ave, utilizo dos elementos da Natureza, tão belos
O sopro do ar, a água da vida, o fogo ardente e a terra do chão
 
Meu castelo é minha fortaleza, meu próprio encanto
Sou pedra que nasce santa, que a razão desconhece
Peco tanto que blasfemo por quem a emoção se esquece
Desde a luz, ilumino no coração com minha fé
No meu corpo sinto átomos em cada canto
Desde a aurora, lá fora, aqui dentro, até o manto
Mola propulsora no caminho por onde ando. Então,
Pra ver a verdade, sozinho ando com meus próprios pés
 
Sou pedreiro, construtor, eterno aprendiz
Mestre de obras ensinado pela retidão
Todo dia busco com honra meu próprio pão
Se me pedires um pedaço, tens o mais saboroso
Se o pedaço for um conselho, dou o mais honroso
Laboro incessante com alegria, calos no pensamento
Seja a estação, frio ou calor, vivo intenso o momento
Só tenho brio em dizer à vaidade: - não fui eu quem fiz

Divaldo Ferreira Souto Filho
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