Poema Sujo Mal Lavado


POEMA SUJO E MAL LAVADO
Em homenagem a Ferreira Gullar
 
Às vezes sou Ferreira Gullar,
Outras vezes sou um cidadão comum...
            Corpo pintado de memórias dilaceradas,
            A guerra de Tróia não foi no Brasil,
Mas o cavalo foi nos dado de presente...
                        Caminhando pelos trilhos da ferrovia abandonada
Tem muitas tardes uma locomotiva,
            Quero que este poema seja lido ao som duma bacchiana
                        O Mundo é grande, vai até o Piauí e um pouco mais...
Há muitos dias numa leitura de poema...
            Buenos Aires às 4 da tarde me lembra São Luís da década de 30...
                        Terra de Odorico Mendes e Sousândrade...
Um urubu no matadouro e a costela do Diabo entre morcegos...
            Maria do Carmo e a palestra do Dr. Bacelar,
Os soldados e os operários...
            A Via Láctea numa gaiola de sombras...
                        Uma noite metida na língua da boca...
Pleonasmo? Troquemos por gaveta do armário então!
            O cheiro do bicho, o rio de lama, a pêra podre...
            Gonçalves Dias é de Caxias...
            Índios e caranguejos, simbiose histórica da colonização...
            O Pássaro vermelho é azul...
Camélia caiu na vida, como previra Dumas Filho!
            A balança Filizola pesando os sentimentos do poeta...
            As fábricas falidas e a seleção maranhense de futebol...
            O relâmpago de Júpiter sobre a cidade verde e canora,
            A cidade suja de versos, versos indo pelo ralo,
            Pelo esgoto da Rua do Sol, da Rua da Paz...
O poeta acorda na zona...
            Musas circunstanciais: Marília, Isabel...
                        O suicídio na Rádio Timbira!
                                   O Norte do Brasil fica em todo lugar, até mesmo no Sul...
O avião joga meus versos imprestáveis sobre o mar...
                        As caravelas de engrenagens escangalhadas se enchem deles...
            A velocidade da cidade é a circulação do dinheiro!
E os passarinhos cantam debaixo do guarda-roupa!
A força da gravitação é metabólica,
Em algum lugar do universo, agora mesmo, um sol se apaga...
As palavras são coisas vivas, talvez, de verdade, as únicas...
Um rato passeia na parreira,
O homem está na cidade,
A cidade está à vista do rato...