Os apertos do passageiro de ônibus na cidade grande

 

Eu sei que outro poeta
já abordou a questão
mas não vou me escusar
de expressar opinião
do que passa o usuário
que viaja de busão


Um sujeito acorda cedo
já lembrando o motivo
de saber que é precário
seu poder aquisitivo
quando separa o dinheiro
pra pagar o coletivo


Ele vai para seu ponto
esperar a condução
Mesmo que exista outro
meio de locomoção
esse é o mais barato
que dispõe um cidadão


Mas não é toda parada
que possui a cobertura
Se na chuva é nocivo
no sol é uma tortura
Tá faltando o prefeito
investir na estrutura


Quando tem dois motoristas
fazendo o mesmo trajeto
o primeiro estaciona
no lugar que é correto
o outro vai contornando
e do ponto passa reto


Quando chega o busum
já bastante atrasado
é um acontecimento
para ser comemorado
e também pra lamentar
porque vem superlotado


Quando a porta se abre
o povo se aglomera
Sobe culpando o chofer
pelo tempo da espera
que ficando exasperado
desce o pé e acelera


Quem deseja um dia ser
motorista de busão
acho que um requisito
pra passar na seleção
é saber estacionar
e arrancar de supetão


E no banzo empoeirado
falta espaço e assento
Sobra para o cobrador
escutar o xingamento
como se ele prestasse
serviço de atendimento


Pro passageiro porém
é maior o dissabor
Sem poder nem se mexer
ele escuta o cobrador
gritando na caradura:
- Tem lugar no corredor!


E o chofer na direção
que não é bobo nem nada
pra poder sair no lucro
de parada em parada
vai fingindo que não vê
a lotação esgotada


Se ele sabe que ali
já não cabe um inseto
e no ponto vê alguém
chamar com o dedo ereto
escuta o povo gritando:
- Motorista! Passa reto!


Numa curva da estrada
de repente o motorista
dá uma freada brusca
no momento que avista
um cachorro ou bicicleta
atravessados na pista


Mas também o insensato
nem desvia no trajeto
quando vê que tem buraco
passando nele direto
e o passageiro surpreso
é jogado para o teto


Como se fosse pipoca
estourando na panela
uma bolsa de mulher
salta por uma janela
e a pasta dum sujeito
vai bater numa canela


Quem faz a baldeação
paga a tarifa dobrado
achando que não compensa
o preço que é cobrado
que até fica pensando
em mudar pra um sobrado


Um chofer se acostuma
a topar na sua frente
ruas congestionadas
por uma chuva torrente
passeata e barreira
ou até por acidente


Numa viagem comprida
o passageiro se apinha
tão socado e espremido
que nem lata de sardinha
gritando pro motorista:
- Bota mais carro na linha!


Mas o dono da empresa
pra faturar uma nota
pretextando melhorias
inventa uma nova rota
sem fazer investimento
na ampliação da frota


Quando é hora do pique
é bem maior o aperto
se entre banzo e motor
não existe um acerto
e no meio do percurso
ele para pra conserto


Todo mundo reclamando
vai descendo pela frente
e na beira da estrada
se espera novamente
por outro carro que vem
abarrotado de gente


Botam uma melancia
onde não cabe azeitona
e aparece um carteiro
solicitando carona
como se aquele banzo
fosse igual à rexona


Todo dia o cobrador
vê passando na roleta
um povo mais esquentado
que pimenta-malagueta
e vai ouvindo o xingão
que é dito de veneta


Um passageiro pergunta
qual é a sua parada
Seu destino era Lindóia
mas está na Cavalhada
Só então ele percebe
que pegou a linha errada


Tem aquele cidadão
que pegou o circular
e por estar de ressaca
vai sentado a cochilar
mas depois de acordado
desce no mesmo lugar


Um outro sobe ligeiro
pois vai pra Medianeira
fazendo o trajeto em pé
porque nunca tem cadeira
No meio do empurramento
já desce sem a carteira


Quando algum trabalhador
se levanta de repente
faz sinal e quer sair
tem na porta tanta gente
que só consegue descer
três paradas para frente


O trabalhador cansado
abre a boca e estrila
quando vê que um rapaz
que está na segunda fila
vai entrar no corredor
carrendo uma mochila


Naquele tempo que o bonde
circulou pela cidade
havia mais segurança
conforto e tranqüilidade
e pra conversar o povo
ficava mais à vontade


E hoje ninguém conversa
no corredor espremido
Vai todo mundo cansado
com sabonete vencido
E quem está no assento
é com o fone de ouvido


O pobre do motorista
segue pela rodovia
escutando xingamento
do centro à periferia
como se ele prestasse
serviço de ouvidoria


E tem ONG em campanha
pedindo à população
que o seu carro ou moto
troque pela condução
Tem que haver alternativa
para a superlotação

 

Carlos Alê
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