Sempre que vejo a lua
vejo uma lua descaroçada
por mil olhares parelhos
de outros mais sonhadores.

Lembro então de tuas nádegas
(ou maçãs do rosto, ou joelhos)

Fico co’o pescoço duro, meu bem,
mas não paro de olhar...
(Lembro enfim dos teus seios,
luas gêmeas, únicas,
quase minhas)

Sempre que vejo a lua
o ar fica mágico co’a tua presença.
Ergo os olhos pro céu
estou na rua,
na madrugada...

Nada importa, então, nada:
não escuto os conselhos
e nem sigo as regras
de poetas outros como eu,
bissextos,
que divagam em outros sonhos,
outros pensares.

E nem me comove a sorte madrasta
(deles, poetas)
se proclamam aos quatro ventos
com voz límpida, resoluta, forte

a derrota da morte, e
a cura de todos os males
(os próprios, e os da humanidade)
co’a farmácia da paz, da canção, e do amor...

Pois tudo isso prá mim fica vazio, sem cor,
sem sentido, sem vida,
se não estás aqui, comigo, querida.
Bate então uma tristeza imensa,
uma saudade...

Mas quando olho mais pr’além, lá pr’o infinito
as dores minhas se vão pra outros ares, e
me invade aquela ternura antiga,

pacífica e contida,
autista, louca e solitária...

E quando enfim meus olhos alunecem
é que já quase tenho a ti;
finjo que sou teu astro-rei
e que és meu satélite.

Na minha cabeça aloucada
te tomo nos braços, nua,
e resplandeço só pra ti, moça celeste.

Então te possuo com ânsia,
com fome libertária,
e me orvalho contigo no meio da rua.

(Sou agora teu valente escudeiro,
teu guardião, o dono da rosa.)

E tudo some no meio
da tua nuvem de algodão,
macia, doce, cristalina, cheirosa...

E as casas da rua somem,
E a rua se vai num turbilhão... As vozes
já apenas sussurram, emudecem,
e o tempo pára.
Os poetas da noite e suas musas se vão,
e a vida inteira fica suspensa
no brilho dos teus olhos
emocionados.

Deito então teu corpo no éter frio, no ar,
na Via-Láctea, e brilho só pra você,
menina mágica dos meus sonhos,
minha pequena moça lunar...

Uma viagem na madrugada, lua cheia, hora do lobo...

Armação dos Búzios - Rio de Janeiro

Fernando Naxcimento
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