Conto: Penteadeiras Solitárias

Conto: Penteadeiras Solitárias

— Você guardará as flores no bolso de seu paletó? — perguntou, antes de dar um pequeno passo simplório em direção a cama. 

No entanto, ele não se separou do espelho para responder a uma pergunta que justifica o amor e a morte dos fantasmas das alunas que não dançaram com o sr. Louis Evans. “ Ah, meu amor!”, disse-lhe de costas, observando tudo o que existia refletido no espelho. O piano de cauda e os castiçais, os dosséis e as colunas de Partenon, Sonata ao Luar e à cegueira da harpista, à sensação de inferioridade ao atravessar o salão e à imortalidade que não havia tomado a aluna pelo braço, os mendigos da Praça da Sé e os escanzelados cães que os acompanhavam, os segundos do amor, o reverendo e o julgamento aos corações famintos, os carentes, os indisciplinados numa secreta vastidão dos séculos acurados, vivenciando os seus incomunicáveis amores, dentro da complexidade de múltiplos vazios. Mas havia aqueles olhos cinzentos que se alteavam e tornavam-se cada vez mais próximos do outro rosto a beijar os seus cílios dourados, sendo o bastante para modificar a eternidade de uma lembrança para a outra. Embora ainda sentisse as pesadas pálpebras descendendo conforme a fenecida movimentação dos lábios e das lágrimas; ele colocou uma das mãos sobre o próprio peito, perguntando a si mesmo, se aquele amor continuará até a sua velhice.

— Não beije o meu olhar, pois as nossas lágrimas se uniram e elas não alcançam o que sentimos em nosso silêncio ocultado dentro da união de nossas palavras amorosas... — ele silenciava, esperando a hora em que o jarro de orquídeas fosse partido pela interioridade decrépita da eternidade? Uma inevitável confissão os condenaria, e, dentre todos os seres humanos, não haveria maior natureza de abandono do que os instantes refugiando-se nas trêmulas mãos sobre os ombros do sr. Louis Evans, e, quando ele se afastou do espelho, lentamente, o haurido beijo em suas pálpebras o fez sublimar o que vinha à tona.  

Eloisa Alves
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