Delivery Cabeça de Porco

A sogra da minha irmã criava porcos, na década de 70, na favela. E era favela mesmo! Não tinha essa coisa de comunidade, não! E muito menos, Vigilância Sanitária.No dia de matar o porco era uma festa, a vizinhança ficava nos arredores vendo o porco dar o último suspiro.Os pedaços já estavam vendidos, antes mesmo, do porco morrer; e a bacia para receber o sangue, pro futuro chouriço, ficava à espreita.Depois do porco morto e esquartejado, tive como tarefa, levar a cabeça do porco na casa de uma senhora, que morava na "Bica". Deram-me um carrinho de mão, colocaram a enorme cabeça do porco com as instruções:- Leve na casa de dona Jussara, já acertei o preço de 30 cruzeiros com ela.E lá fui eu, carregando a cabeça do porco, com os braços finos, com medo que o carrinho virasse e rolasse a cabeça na areia.Cheguei na casa.- Dona Jussara! Dona Jussara!Ela apareceu com o dinheiro esticado entre os dedos:- Tá aqui os 30 cruzeiros.- Mas agora é 35.- Mas ela havia combinado 30.- Mas mudou, agora é 35.- Então, eu não quero mais.- Tá bom!Voltei com a cabeça de porco , tendo na consciência que tinha feito besteira.- Ué, voltou! Não achou a casa de Dona Jussara?- Achei, mas ela desistiu de comprar.----------------------------------Agora, eu entendo o que eu fiz, cobrei, por minha conta, o "Delivery Cabeça de Porco", mas ainda não era a época.

Selma Nardacci dos Reis
© Todos os direitos reservados