sou caipira do mato, caboclo pacato, porem muito feliz
sou filho da terra vivo da terra e não nego a raiz
desde pequeno morei no sertão sempre fui peão e tive felicidade
eu gosto de olhar a imensidão a poeira do chão e sentir a liberdade
isso me traz alegria Deus me livre de um dia morar na cidade
isso eu falava quando era moço peão garantido
onde eu chegava era cumprimentado por ser conhecido
meu cavalo alazão pisava firme no chão e já se espantava por qualquer zunido
eu posso dizer que em meio a natureza
eu sei me virar a terra cultivar com grande destreza
e se falar de gado já estou amontado com muito firmeza
meu alazão afamado é muito ensinado é mesmo uma beleza
nas pegas de gado que existia lá no meu sertão
eu estava no meio montado num arreio
calçando uma perneira e vestindo um gibão
minhas botas invocadas era apertada por um par de esporas
onde o macho chora sentindo o ferrão
minhas tralhas eu conservo e as trago comigo com estimação
não as troco por nada e as tenho guardada por recordação
pra lembrar do passado de um tempo adorado tempo de peão
mas o tempo passou e aquele moço foi se cansando
perdendo a saúde e toda a virtude foi lhe deixando
depois de velho e cansado perdeu a liberdade
muito amargurado não teve escolhas mudou pra cidade
na cidade ele leva uma vida de cão
já não banha no rio tambem nunca mais viu o luar do sertão
hoje vive privado e se olha pro lado só vê poluição
ele já não sabe o que é levantar bem cedinho e tomar seu café
olhando a boiada um pouco deitada um pouco de pé
desleitar a vacada e o leite entregar pra sua mulher
pois aqui a ordenha é na geladeira leite de primeira já vem desnatado
requeijão e coalhada é uma maravilha se encontra de pilha no supermercado
o povo adora e compra de quilo fica maravilhado
porém eu já conheço e um alto preço eu tenho pagado
por não gostar dessas coisas pois aqui até milho verde se compra enlatado
sem poder fazer nada eu venho sofrendo aqui na cidade
relembrando o passado do tempo adorado de minha mocidade
mas o tempo passou e comigo ficou somente a saudade
as vezes pensando eu vou relembrando meu tempo de criança e vendo a mudança da humanidade
o povo já não sabe o que é um bridão
um par de esporas um perneira, um facão
um chapéu de couro,um estribo cor de ouro uma peitera e um gibão
ninguém mais conhece o que é um ferrão
o que é um bacheiro cabresto ou cabeção
um pelego nunca viu também nunca assistiu uma festa de peão
isso tudo eu já vi e tenho comigo aqui bem guardado
num quarto seguro,sombrio e escuro que vive trancado
ali eu só entro quando não mais aguento eu volto ao passado
e fico sozinho chorando baixinho muito amargurado
e assim vou vivendo esquecendo o presente e lembrando o passado
pois aqui na cidade ainda sinto saudade das pegas de gado
das festas juninas de ver as meninas de vestido rodado
dançando e bailando assim procurando o seu namorado
que saudade eu tenho do carro de boi que deixei encostado
a chuva molhando a madeira pubando já está desgastado
o cupim já se apossa comendo a carroça engolindo o passado
por aqui vou parar não vou mais lamentar e nem demonstrar a minha paixão
desculpem os lamentos e o sofrimento deste pobre peão
pois sou pura ingenuidade hoje eu vivo na cidade mas não sou cidadão