QUASE UMA TRAGEDIA-(conto)-

Quase uma tragédia
 
Naquela manhã acordei diferente. Esfreguei os olhos, espreguicei-me como um cão, com tanta força que meus joelhos estalaram, não doeu, mas quase que as rótulas saíram do lugar. O Sol já estava alto, meu Deus, estou atrasado, dei um pulo da cama como se fosse um gato, coloquei um chinelo e sai correndo com o outro na mão rumo ao banheiro. Fiz minha higiene pessoal numa velocidade incrível e desci para o café, moro em um sobrado, não tinha ninguém em casa, putz, eu estava mesmo atrasado, olhei no relógio, dez horas, hoje vou ser demitido, pensei, preciso de uma desculpa, mas já usei tantas que meu repertório esgotou-se, que faço? Cheguei à garagem, cadê o carro, sumiu, só faltava essa, meu irmão pegou. Aquele*#**%#, tô ferrado, meu emprego já era, minha cabeça fervia, saí correndo, eram doze quarteirões até o trabalho e meu preparo físico não é dos melhores. No terceiro quarteirão eu já estava quase morrendo de cansaço, precisei parar e percebi que o ar do planeta parecia pouco para mim. Dez minutos mais e eu estava pronto, recomecei a marcha, agora mais lenta, a camisa já grudava no corpo de tanto suor e ainda faltavam nove quadras até o destino, vou morrer, que droga, o pensamento já embaralhava, os olhos embaçavam, uso óculos, e se os tirasse não enxergava quase nada, não havia tempo para limpá-los, quinto, sexto, sétimo, oitavo quarteirão e ploft, lá estava eu estendido no chão. Tropecei nas próprias pernas e me ralei todo, o pior é que não tinha ninguém para me socorrer. Os cotovelos ficaram em carne viva, os joelhos, agora sim, saíram do lugar de verdade e doeram pra caramba, só não chorei porque estava com muita raiva. Levantei com muito sacrifício e proferi algumas palavras impublicáveis endereçadas ao meu irmão, mas de repente veio uma idéia brilhante na cabeça, está aí a desculpa que eu precisava, já que estou todo ralado vou inventar para o chefe que fui atropelado, ele manda eu ir para o hospital e ainda vou ganhar uns dias de folga, cara como você é esperto, pensava eu, enquanto arrastava uma das pernas e caminhava bem devagar rumo ao sacrifício final. Demorou mas cheguei porem tive uma surpresa, a empresa estava fechada, por quê? Ainda não era onze horas, horário que fecha para o almoço coletivo e o pior, nem o guarda estava na guarita, ai, ai, como doía, e agora? Vou sentar na calçada e esperar. Fiquei ali, gemendo e suando, devo ter perdido uns cinco quilos no trajeto. O tempo foi passando, a dor diminuiu, o cansaço foi embora, mas depois de três quartos de hora achei estranho não passar ninguém na rua, mesmo a empresa estando localizada na periferia. Mais meia hora e nada. De repente um barulho de motor, um carro dobrou a esquina, era o meu e com o *¨%*#+* do meu irmão ao volante. Ele parou abriu a porta do carro desceu correndo e veio ao meu encontro preocupado perguntando o que havia acontecido. Só não o agredi porque não conseguia me mexer, o sangue esfriou e eu travei, mas a língua não, então, foi uma enxurrada de “palavras amorosas” que proferi com muito carinho a ele. Por sorte ele estava com um amigo que ajudou a me colocar dentro do carro e seguimos rumo ao hospital. Eu estava bem, mas se mordesse uma cascavel ela morreria na hora, foi aí que meu “querido irmão” fez a pergunta derradeira, o que eu estava fazendo ali defronte a empresa que trabalho no Domingo...? 
 
Pedro Martins
22/03/2011