Num poeirento salão de um solar medieval,
Que guardava em silêncio um passado glorioso,
Uma pena, uma cruz e uma espada feudal
Trocavam comfissões, que eu ouvia curioso.
Conta a espada altaneira as suas aventuras,
As pugnas memoráveis em busca de glórias,
Os feitos imortais, seus gestos e bravuras,
E os troféus que alcançara em sangrentas vitórias.
"Sempre tive a brandir-me as mãos bem adestradas
De heróis e espadachins. E em combates renhidos,
Muitos corpos deixei tombados nas estradas,
De ardorosos rivais por mim neles vencidos.
Nunca tive a empunhar-me o braço de um sicário,
Mas as fidalgas mãos de nobres cavalheiros.
O meu campo de ação profusamente vário,
Nunca teve a manchá-lo um só golpe traiçoeiro.
Com a viseira erguida, eu sempre entrei na liça,
Desprezando as razões do rival mais ousado,
Por minhas próprias mãos eu sempre fiz justiça,
Defendendo o inocente ou punindo o culpado.
Que seria da vida, ausente o meu poder,
Que a justiça assegura e o direito mantém?
Um campo em que a desordem a lavrar e crescer,
O mundo transformava em terra de ninguém!
Guardo inda hoje, de tudo, uma saudade n'alma,
Mantendo a fidalguia e a nobreza sem par,
A sofrer em silêncio a tortura da calma,
Envelhecendo inerte em um sombrio solar!"
Uma lágrima cai, e a lâmina umedece,
E desliza sutil até tocar o chão;
Escuta-se um soluço, e a espada emudece,
E o silêncio outra vez caiu sobre o salão.
Fala em seguida a Cruz humilde, a recordar
A sublime missão para a qual foi criada,
O mistério que envolve a origem milenar,
E o respeito que inspira tradição sagrada;
"Eu simbolizo a Fé, a Dor, os Sofrimentos!"
Num murmurar cadente assim falava a Cruz.
"Humildemente elevo a Deus os pensamentos,
Transfigurando os maus, os conduzindo à Luz!
Somente o amor constrói por toda a eternidade!
A conquista da força é sempre transitória!
A paz jamais se obtém calcando a liberdade,
Nem quem sufoca o amor jamais logra vitória!
Cala-se a Pena, e, assim findaram-se as confissões.
A aurora que esgarçava, o ambiente torna em Luz.
E eu vi cheio de espanto,unindo os corações,
Num exemplo de irmãs, a Pena, a Espada e a Cruz.
Jaubert