Nas noites frias do saudoso exílio
Retiro-me da rotina física
Golpe de Estado, guerra civil entre Apolo e Baco
Levando ao estado de crise abrupta, indomável caos de uma catarse lírica
Grande espelho de infinitas imagens, minha inegável tabula empírica
Versejo sobre rabiscos inocentes cada vez mais fracos
Imergindo-se nas águas de Lethe, mas alguns posso puxar para meu barco
Mesmo com muita poeira áurea inutilizada, em digressão metalinguística
Condeno-me a vagar alegre pelas encruzilhadas
Cujos caminhos a mim não mais existem
Perguntando por que muitas delas nem sequer foram traçadas
Da pomba branca antiga só as penas restam
Pois a ignorava quando ela pousava em minha cabeça
Não a alimentando em seu sujo viveiro
Depois de cessar o som das asas e o canto
A porta acabei abrindo aos corvos, trazendo miséria e pranto
Os pensamentos me cuidam na solidão?
Ou sou em que os procuro sem pensar?
Acidificando o momento nihil
Vivendo a preocupada ataraxia num ambiente hostil
Experimentando a auto-onipresença em universos paralelos
Cogitaria o eterno retorno? Viver antiga nostalgia ou eterno transtorno?
Mito da caverna de Parmênides ou fábula de horrores na masmorra de um castelo?
Em que açoites fazem uma mente ociosa ao desorizonte cavalgar
Reproduzem as trilhas sonoras de antigos filmes
Retro projetados, à luz de velas, na puríssima simplicidade
Inúmeros quadros sorridentes na parede, uns choram, outros gargalham
Sobre o resultado da metamorfose e os trajes da nova realidade
Sobre os prazerosos devaneios da loucura lúcida
Tendo abandonado o velho feudo de labutas lúdicas
Contaminando-me com vícios viciosos dessa terra pútrida
Com ambições desejar acumular, para enterrar, sendo um eupátrida
Atrás dessas grades invisíveis melhor se pode respirar
Novos ares já familiares substituídos por fumaça e mofo
Pelo vão das barras e anos em vão o oculto se pode enxergar
Que o brilho das estrelas cintila mais numa poça d’água do que no céu
Que o que buscamos nos céus está em nós, tão longe, tão perto
Nada além da terra, nada além do firmamento, nem errado e nem certo
Apenas um jogo de luz e sombra, eterno e interno contraste barroco
No clássico teatro, Apolo e Dionísio lutam pelo troféu
Trégua na tragédia grega
Krónos descansa, cessando as tempestades de areia
Mortais pensam o tempo, passado e futuro
Sendo isso abstrações de suas mentes pérfidas
Para regrar a vida, tecer sua linha, facilmente cortadas
Jogadas numa variada malha labiríntica
Ordinário tapete da olimpíada dos eupátridas
Acorrentado nas penhas roubar o fogo em ousadia ávida
Antes a pomba branca pousava sobre minha cabeça
Desejando atenção e pão
Agora uma águia, devorando-me imortal este corpo lânguido
Rodeado por corvos, que me tirarão desse vale
Apó panthós kakodaímonos! Brado, de que tudo vale?
Carpe diem ou voltar para casa e vender minha lã?
O meu sou olha para meu fui, com mais cautela e aceitação
Voltando à diária guerra, acabou o almoço, soldado
Acabou o castigo, Prometeu, quebre as correntes!
Evocando estou a velha eudemonia rizospástica
Alcançarei após o abraço entre minha carne e minhas cinzas
Após a síntese dos meus livros já queimados e dos recém-escritos
Tratado de paz entre Apolo e Baco, que eram anti-egos beligerantes
Maniqueísmo se rompe, ‘’in medio est virtus’’, julgamento justo
Expio minha extradição, para que com livre arbítrio pulem os novos grãos de areia