O tom rosa verteu-se em roxo.
E o violeta quis violar outras cores.
O dia devorou os resquícios da noite.
Passos firmes esmagaram o chão.
Uma garganta abriu-se em grito.
E a demência alijou as asas dos anjos.
O roto manto da madrugada
já não cobriu os loucos.
E uma árvore agonizou em dor.
Mãos que ganharam unhas
e se fizeram de possantes garras.
O riso foi tomado de assalto pela ironia,
e o imperial sarcasmo foi cruel com todos.
Culparam-se os deuses de carne e osso,
e os mitos de si caíram na própria desgraça.
O céu, de raiva, lançou raios sobre a terra.
E a terra, imprudente, lançou blasfêmias aos céus.
Tensão num ponto qualquer,
por demais insignificante para ser visto.
Olhos choraram, e corações riram, alucinados.
Uma pena, de dar dó, dolorida dor.
Mãos sujas, um tribunal, todos culpados.
Onde estão os inocentes?
Vida que devorou os viventes.
Teatro onde o drama era totalmente real.
Homens e mulheres viscerais.
Instintos, a franqueza bruta, primitividade.
Espadas se atiraram contra os punhais.
Correria. Olha a ladeira, olha o abismo!
Cuidado com as palavras de pedra.
Olha o buraco! O imenso fundo sem fim.
Inferno dos trouxas, fantasmas insepultos.
Competências superficiais.
O ritual dos lambe-botas.
Os úteis inúteis,
fragmentados em pedaços,
posseiros dos cacos do mundo,
tirando a sorte, a desfolhar um trevo,
a jogar dados, a embaralhar cartas.
E a cartomante profética nada disse.
Nem bola de cristal, nem sagrados búzios,
nem místicas runas, apenas a desconexão.
O caos reinante de um dia de loucura.